Discutir a legislação a bem da qualidade da engenharia
A portaria 1379/2009, da Lei 31 de 2009 tem-se tornado num aceso foco de discussão entre os profissionais representados pelas Ordens dos Arquitectos (OA) e dos Engenheiros (OE) e pela Associação Nacional dos Engenheiros Técnicos (ANET).
Pedro Cristino
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A portaria 1379/2009, da Lei 31 de 2009 tem-se tornado num aceso foco de discussão entre os profissionais representados pelas Ordens dos Arquitectos (OA) e dos Engenheiros (OE) e pela Associação Nacional dos Engenheiros Técnicos (ANET). O anterior Bastonário da OE, Fernando Santo, afirmou-se como um opositor desta portaria e elaborou uma comunicação na qual tecia duras críticas ao documento. Por sua vez, enquanto ainda eram apenas candidatos à liderança da OE, tanto Carlos Matias Ramos, como Fernando Silveira Ramos, apontavam fortes críticas a este diploma. Já o presidente da Associação Nacional dos Engenheiros Técnicos, Augusto Ferreira Guedes, declarou que, ao invés de se alterar a portaria 1379/2009, deveria proceder-se à correcção da 701-H/2008.
“Absurdo e prejudicial para o sector”
Para Fernando Santo, o resultado final da portaria 1379/2009 é “um absurdo e é prejudicial para o sector da construção, que deverá promover a defesa da qualidade e uma efectiva confiança pública entre os técnicos reconhecidos e as competências que deverão garantir”. Neste sentido, o anterior Bastonário mencionou que a portaria acaba por “não respeitar a Lei n.º31/2009, aprovada sem votos contra pelos diferentes grupos parlamentares”. Este resultado é classificado como “mau” por parte de Fernando Santo, “porque não teve devidamente em conta as diferenças entre a formação dos engenheiros e dos engenheiros técnicos, permitindo a estes projectar obras de grande complexidade e responsabilidade, onde a formação de base de três anos não é suficiente”. Por outro lado, este diploma reconhece aos arquitectos “competências específicas que não correspondem à sua formação e que o mercado não reconhece”, na medida em que permite que “os arquitectos possam dirigir obras de construção de edifícios até ao valor de 2.656.000 euros”. Para além destes dois elementos, Santo considera também que a portaria “padece de erros técnicos graves associados à definição dos tipos de obras”.
A portaria “extravasa e contraria” a Lei 31
Fernando Silveira Ramos, candidato a Bastonário da OE nas últimas eleições, ex-presidente da Associação Portuguesa de Projectistas e Consultores e gerente do gabinete Consulmar, declarou-se como um acérrimo opositor da portaria 1379/2009. Numa troca pública de mensagens com o ex-ministro das Obras Públicas, Mário Lino, Silveira Ramos integrou-se a si próprio no conjunto dos engenheiros que consideram uma “bomba relógio sobre a qualidade de engenharia” a portaria 1379/2009, um diploma que, segundo o responsável da Consulmar, “extravasa e contraria a própria Lei 31”, da qual resulta. Silveira Ramos acusa a portaria de, “em muitos dos seus artigos”, condicionar “a autoria de projectos, a responsabilidade pela fiscalização de obras ou a sua direcção, a “engenheiros especialistas ou seniores””, que são graus de qualificação “não automática na OE e, portanto, sujeitos a aprovação caso a caso por júri competente para o efeito”, abrindo também, contudo, essa possibilidade “a engenheiros técnicos com mais de x anos de experiência”. Neste sentido, Silveira Ramos referiu que um engenheiro civil, não poderia agora fazer obras que anteriormente já tinha feito sem se submeter “a pedido de qualificação específica na OE”, enquanto que um engenheiro técnico não estaria sujeito a tal, dado que os seus anos de experiência o qualificavam automaticamente para tal. Neste âmbito, Silveira Ramos considera “um espanto” a “consideração pública pela formação dos engenheiros”. Por outro lado, e entre outras críticas, o responsável da Consulmar aponta a possibilidade de proceder à “direcção de fiscalização e da direcção de obra” por parte dos arquitectos, “sem cuidar de terem sido as condições mínimas para tal”. “A qualidade do construído não parece ter ficado protegida”, conclui. Para atenuar os efeitos de um diploma que considera errado, Silveira Ramos aponta um conjunto de sugestões, como, a título de exemplo, “remeter para os procedimentos concursais a obrigatoriedade de definição das áreas e do âmbito da experiência específica exigível em cada caso”, referindo que, desta forma, a qualidade dos diferentes técnicos ficaria garantida, “em benefício evidente da engenharia”. Outra das opções contempladas pelo texto de Silveira Ramos consiste em condicionar o exercício de fiscalização de obra a arquitectos com “formação específica nessa área”, garantindo-se, deste modo, a “criação antecipada de competências antes do direito ao seu exercício”. Antes das eleições, este engenheiro civil havia assumido uma “dura” contestação da portaria, no caso de ser eleito. “Em 24 horas vamos colocar este assunto nos jornais, porque a luta tem que ser pública”, havia afirmado Silveira Ramos.
Gestão de obra por parte de arquitectos é “desadequada”
O actual Bastonário da OE, Carlos Matias Ramos, faz também parte do coro de protesto face a esta medida elaborada pelo Ministério das Obras Públicas, durante o exercício de Mário Lino. Também para Matias Ramos, a gestão de obra por parte de arquitectos, permitida pelo diploma, é desadequada. “Toda a gente percebe facilmente que, com cursos que não dão conhecimento em matérias como essa, não podem desempenhar tarefas complexas, como a portaria permite”, declarou ao Construir. A portaria possibilita que os arquitectos possam fazer a gestão de obras da categoria 5, quando, no seu entender, “não deveriam ultrapassar a categoria 2”. “Se entendemos que actos de arquitectura devem ser atribuídos aos arquitectos, porque não são atribuídos actos de engenharia aos engenheiros”, questiona Matias Ramos. Contudo, o Bastonário não deixa de reconhecer que “a Lei 31 de 2009 substituiu o decreto 73/73 com muita vantagem, porque cobre as obras particulares e as obras públicas, cobre projecto, cobre fiscalização e a gestão de obras e todas as actividades associadas a todo um percurso necessário desde a concepção à execução”. Todavia, relativamente à portaria, Matias Ramos considera que “o nível de exigência não é compatível com a complexidade das obras a realizar” e deixa claro que “não há qualquer espírito corporativo, mas sim a lógica da exigência, da qualidade e do rigor”.
Soluções na comissão de acompanhamento
Do lado da ANET, é a alteração da portaria 701-H/2008 que se reveste de maior importância, bem como do seu anexo II, “face ao Decreto-Lei 123/2009”. De acordo com os responsáveis da associação, é entendido como engenheiro técnico especialista “um membro da ANET com um diploma de segundo ciclo em engenharia da sua especialidade e com dez anos de experiência profissional e formação comprovadas para o conjunto de actos profissionais específicos onde é considerado especialista” desta associação presidida por Augusto Ferreira Guedes. Em causa, segundo os mesmos responsáveis, está a “qualidade dos actos, quem os pode praticar, se tem formação suportada numa declaração por acto específica e não uma declaração que dá para tudo”. Ao Construir, Augusto Ferreira Guedes havia já declarado que, o que interessa, é defender a qualidade da engenharia praticada, afirmação que vai de encontro aos desejos do Bastonário da OE. Como representante dos engenheiros técnicos, Ferreira Guedes acha errada a exclusividade que os membros da OE retinham sobre alguns projectos. Contudo, é também da opinião de que “é possível melhorar aquilo que foi processado por uma lei que demorou mais de 20 anos a ser trabalhada” e declara que todos saíram “prejudicados por aquilo que era uma certa selva no projecto e na obra”. Neste âmbito, o responsável da ANET refere que, “dentro da comissão de acompanhamento”, serão encontrados “os mecanismos e as soluções para um ou outro problemas que existam”. No entanto, o que Augusto Ferreira Guedes considera estar errado não é a portaria 1379/2009, mas sim a anterior, a 701-H/2008 que, “precisa de ser corrigida porque a actual portaria está bem”. “O que está mal é alguma legislação dispersa que a comissão de acompanhamento terá oportunidade de analisar e de sugerir melhorias”, remata o presidente da ANET.