‘Bolonha obrigou a repensar os cursos’
O professor associado e director do mestrado integrado em Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) respondeu ao pedido do Construir para ajudar a esclarecer uma questão que não tem resolução simples à vista.
Pedro Cristino
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O professor associado e director do mestrado integrado em Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) respondeu ao pedido do Construir para ajudar a esclarecer uma questão que não tem resolução simples à vista.
Os licenciados em Ciências da Engenharia ficam com competências para exercer que funções?
A Licenciatura em Ciências de Engenharia – Orientação Engenharia Civil da FEUP é um Diploma concedido a pedido dos interessados após a conclusão dos primeiros três anos do curso de mestrado integrado. Não confere competências profissionais no âmbito da Engenharia Civil, uma vez que esta parte do curso foca-se, essencialmente, na preparação do estudante nas ciências de base fundamental – Matemática, Física – e de base de Engenharia Civil – Resistência de Materiais, Hidráulica, Materiais de Construção, Física das Construções, por exemplo. Traduz a realização do primeiro ciclo de estudos que, no nosso caso, aproveita essencialmente para efeitos de mobilidade no espaço europeu subscritor do Tratado de Bolonha.
Que áreas cobre a licenciatura?
A estratégia da formação em Engenharia Civil da FEUP consiste no mestrado integrado (MI), sucessor da antiga licenciatura, mantendo a sua duração de cinco anos. As áreas cobertas no MI continuam a ser as identificadas como respondendo às necessidades do País e do mercado – nacional e internacional – abrangendo uma preparação multifacetada de quatro anos, abrangendo as várias vertentes científicas e tecnológicas, e um quinto ano de especialização, onde o estudante poderá escolher entre as áreas de Construções, Estruturas, Hidráulica, Geotecnia, Materiais e Processos de Construção, Planeamento e Vias de Comunicação.
O que mudou nos conteúdos da licenciatura antes e depois do Tratado de Bolonha?
O Tratado de Bolonha (e as regras que definiu) procurou contribuir para uma maior comparabilidade entre os diversos cursos, de temáticas similares, ministrados nos diferentes países. Esse objectivo penso que foi razoavelmente conseguido, o que potencia a mobilidade de estudantes e profissionais no espaço europeu. No entanto, existia a ideia que também iria possibilitar uma certa uniformização dos cursos entre os vários países. Isso não aconteceu nem será expectável que aconteça, pois as condições de cada país são diferentes e o tipo de resposta que as suas instituições de ensino superior deverão dar ao mercado serão sempre, consequentemente, também diferentes. Assim, e em termos conceptuais, os conteúdos que o mestrado integrado em Engenharia Civil da FEUP contemplam não sofreram alterações de profundidade em relação à anterior licenciatura, pois consideramos que a preparação de “banda larga” que procuramos proporcionar assegura que os nossos estudantes estejam preparados para as alterações de conjuntura, cada vez mais frequentes, com eventuais necessidades de modificar o seu campo específico de actividade profissional. Por outro lado, e em face do significado do trabalho no estrangeiro em que muitas empresas da fileira da construção se começam a envolver, temos conhecimento directo que essa preparação multifacetada é um trunfo, uma vez que, em comparação com os seus colegas provenientes de outros países, o engenheiro português demonstra um conhecimento das várias facetas em jogo, capacidade de integração e coordenação que não é fácil encontrar. Mesmo assim, Bolonha obrigou, em alguma medida, a repensar os cursos em termos de conteúdos e, especialmente, nos resultados de aprendizagem (os “learning outcomes”). Houve um esforço importante para procurar reflectir no processo de ensino e na aquisição de competências. Além de que, com a introdução da dissertação final, o estudante é confrontado com a exigência de realizar um trabalho de fôlego, em que tem de investigar por si e tomar opções – mesmo que orientado por um professor – apresentá-lo e discuti-lo de forma profissional.
A não distinção entre os licenciados pré e pós-Bolonha pode levar à perda de qualidade da engenharia praticada no País?
Sem dúvida. A designação de “licenciado” conferida pelo Decreto-Lei 74/2006 aos graus de primeiro ciclo foi, na minha opinião, um enorme erro. Internamente, levanta o problema dos licenciados pré e pós-Bolonha; externamente, continuamos a ter um grau com designação original em contexto europeu. Os graus de 1º ciclo, na maioria dos países que aderiram a Bolonha (e já antes), têm geralmente uma duração de 3 anos e a designação de “bacharelato”, sendo os de segundo ciclo os “mestrados”. Tivesse sido seguida esta linha e as dúvidas que se geram na sociedade portuguesa e a própria comparabilidade internacional teriam sido evitadas.