Alta-velocidade: crónica de um modelo falhado em Espanha
Portugal e Espanha parecem destinados a viver com o fantasma da rede ferroviária de alta-velocidade. Se em Portugal, mesmo que não tenha sido construído um único quilómetro de linha, o investimento ascendeu a 153 milhões de euros, em Espanha a expansão do projecto está longe de estar justificada e promete deixar um pesado rastro. Um… Continue reading Alta-velocidade: crónica de um modelo falhado em Espanha
Prospectiva e H3P supervisionam construção da Barragem do Calucuve, em Angola
Grupo Eurofred formaliza venda da sua filial Horeca Global Solutions
KEO inaugura escritório em Lisboa e duplica número de colaboradores
Twinkloo olha para o futuro do imobiliário em Portugal através de novo podcast
Geberit volta a juntar-se a Miguel Muñoz para espaço na Casa Decor 2024
Iad lança iniciativa que permite ter “estimativa realista e actualizada” dos imóveis
Análise: Mercado de escritórios em Lisboa em “forte recuperação”
Soluções do Grupo Preceram para a reabilitação e reconversão do edificado
OERS acolhe primeira edição dos ‘Prémios de Excelência na Academia’
B. Prime coloca modelo “inovador” da Regus em Lisboa
Portugal e Espanha parecem destinados a viver com o fantasma da rede ferroviária de alta-velocidade. Se em Portugal, mesmo que não tenha sido construído um único quilómetro de linha, o investimento ascendeu a 153 milhões de euros, em Espanha a expansão do projecto está longe de estar justificada e promete deixar um pesado rastro. Um estudo realizado por investigadores da Fundação de Estudos de Economia Aplicada é arrasador para a forma como foi desenvolvido o modelo de negócio da alta-velocidade em Espanha, concluindo que se trata de um projecto que não será rentável “nem para as empresas nem para a sociedade”. Ofelia Betancor e Gerard Llobet estimam que mesmo considerando os benefícios indirectos, como os que resultam da poupança de tempo, a fuga ao congestionamento da rede rodoviária ou o custo diferenciado em relação ao avião, não há compensação face aos muitos milhões de euros já investidos. Os investigadores sublinham que o nível de procura não é, nem será, suficiente para gerar as necessárias receitas que tornem o projecto viável. Este estudo surge na sequência de um outro que havia sido realizado pela mesma organização, e que já era particularmente revelador das discrepâncias. Desde logo, referir que a rede espanhola, com 2515 quilómetros de linha em utilização e mais 1200 quilómetros em fase de construção, é já a segunda maior do Mundo, apenas superada pelo exemplo chinês (com mais de 11 mil quilómetros). Em termos relativos é mesmo a “líder” mundial, já que representa 54 quilómetros de linha por cada milhão de habitantes, face aos 31 quilómetros registados em França. Acrescem a estes números o facto de o número de passageiros estar longe dos registados em outros países: em Espanha há perto de 12 mil passageiros por cada quilómetro de linha de alta-velocidade, face aos 158 mil no Japão e 61,4 mil em França.
Crescimento a alta-velocidade
Pouco mais de 20 anos depois da entrada em funcionamento da primeira linha de alta-velocidade, Espanha tornou-se um dos países que maior crescimento registou neste tipo de projectos. Com a entrada em funcionamento dos novos troços, o ratio por milhão de habitantes crescerá até aos 79 quilómetros. O estudo agora conhecido revela que Espanha segue em lugar de destaque na dotação de infra-estruturas voltadas para a alta-velocidade ferroviária, com números que contrastam fortemente com o escasso uso da mesma, muito abaixo das restantes redes de alta-velocidade internacionais. A alta velocidade em Espanha transportou, no último ano, 29 milhões de passageiros, números que revelam um crescimento de 14% face ao que havia sido registado no final de 2013. O registo agora conhecido contrasta com os 420 milhões de passageiros na China, ou os 330 milhões no Japão, ainda que estes sejam dados de 2012. O documento revela que os dados espanhóis são “pobres quer em termos absolutos quer em termos relativos” e mais pobres ainda em matéria de rentabilidade, por mais que, verdadeiramente rentáveis, sejam apenas as linhas entre Tokio e Osaca (Japão), entre Paris e Lyon (França) e entre Jian e Quingdao, na China.
Tecnologia exigente
“A tecnologia da alta-velocidade ferroviária é extremamente exigente em termos de custos, o que exige uma densidade de procura muito elevada para que se gerem benefícios sociais. Mais ainda se tivermos em conta o escasso impacto sobre a actividade económica agregada, os seus efeitos centralizadores no sector dos serviços, o potencial de degradação da oferta convencional da ferrovia e os efeitos prejudiciais no âmbito da coesão territorial”, revelam os autores do estudo. O ponto de partida desta análise reside no facto de em Espanha haver poucos passageiros para tantos quilómetros de rede. Até ao momento, segundo dados do Fomento espanhol, foram já investidos 40 mil milhões de euros na construção das linhas, números aos quais há que acrescentar os 12 mil milhões de euros das linhas que estão em fase de construção. A estes números, soma-se ainda o investimento nas próprias composições. Por responder está a dúvida sobre se este será um investimento recuperado num prazo de 50 anos, contados desde o inicio deste projecto (algures em 1992). Considerando os quatro principais corredores de alta-velocidade, nomeadamente as ligações Madrid-Barcelona, Madrid-Andaluzia, Madrid-Levante e Madrid-Norte (estas ligações representam 70% do tráfego e 60% do investimento total), percebe-se que no caso das três primeiras o melhor caminho a seguir é a manutenção da sua exploração. No último caso, a sua exploração é claramente deficitária, com encargos crescentes para os cofres públicos. A conclusão é, assim, contundente. A construção das linhas ferroviárias de alta-velocidade “não aporta nenhum benefício às empresas públicas nem à própria sociedade, considerando a dimensão do investimento realizado”. Os investigadores lamentam que o Governo espanhol não tenha publicado qualquer análise em que se tenha baseado para decidir a construção de cada corredor, além de recordar o alto custo de oportunidade que a sociedade espanhola assumiu como consequência desses investimentos, a que acresce a persistência das suas consequências no futuro”.
O “exemplo” português
O projecto ferroviário de alta velocidade, impulsionado pelos governos de José Sócrates e cancelado pelo actual Governo de Passos Coelho, seria financeiramente inviável, revela uma auditoria do Tribunal de Contas. Mesmo assim, em 11 anos foram gastos 120 milhões de euros em estudos, mais 32,9 milhões de euros em custos de estrutura da Rede de Alta Velocidade (RAVE), refere o Tribunal de Contas. Diz o TC que os “estudos preliminares demonstraram que o investimento na rede ferroviária de alta velocidade não apresentava viabilidade financeira”. “Os mesmos estudos demonstraram que o eixo Lisboa-Madrid, o primeiro que se previa vir a ser implementado, também seria financeiramente inviável”, refere a auditoria. Além disso, o TC refere que os “riscos de procura relevantes recairiam sobre a CP e a REFER, empresas públicas economicamente deficitárias”. “Em contrapartida, os pagamentos pela disponibilidade da infra-estrutura às concessionárias gozariam de estabilidade, característica típica das rendas”, refere o mesmo relatório do tribunal.