Opinião: Um Verão desportivo
“É caso para dizer: agora que terminou um verão pródigo em eventos desportivos, é tempo de analisar (e aprender com) os resultados e focar-nos em preparar os próximos”
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Nuno Malheiro da Silva
Arquitecto, Presidente do FOCUS GROUP
nuno.malheiro@focusgroup.eu
Depois de anos de preparação e dezasseis dias de provas terminaram os Jogos Olímpicos Rio 2016. Em 1992 tive o privilégio de estar em Barcelona uma semana, acompanhando a selecção nacional de Judo e assistindo a toda a competição dessa modalidade olímpica. Foi uma experiência inesquecível. Desta vez, apenas pude assistir à distância. Nada se compara com a experiência de estar presente e assistir ao vivo, ou ainda de participar enquanto atleta olímpico, o que apenas posso imaginar. Mas, graças à multiplicidade de canais de TV empenhados na cobertura do evento, consegui seguir várias modalidades, do judo à ginástica desportiva e ao atletismo, e mesmo outras menos populares.
Para os aficionados do desporto, como eu, os jogos olímpicos proporcionam verões desportivos fantásticos. Infelizmente, desta feita, o Rio 2016 teve para mim um sabor amargo de desapontamento e apreensão. Não pela frustração manifestada por alguns portugueses pelo reduzido número de medalhas obtidas pelos atletas nacionais (apenas uma, por coincidência no judo), mas pela circunstância de algumas das modalidades olímpicas – em concreto, a Canoagem Slalom, as diversas disciplinas de Hipismo, do Pentatlo Moderno e do Tiro, o Rugby, o Hóquei em Campo, as corridas de BMX e de BTT, o Basquete feminino e a Esgrima – serem disputadas num complexo olímpico construído com base nos projectos do consórcio que o Focus Group constituiu em parceria com uma empresa de São Paulo, projetos esses que, nem a Prefeitura do Rio de Janeiro, nem o Governo Federal, pagaram na totalidade. Espero, francamente, que agora que os Jogos terminaram e com as receitas obtidas no evento cujo êxito foi celebrado com euforia, as autoridades brasileiras honrem os seus compromissos para com aqueles que – como nós, Focus Group – contribuíram, com muito esforço, para que o Rio 2016 pudesse ser uma realidade.
As competições desportivas são calendarizadas vários anos antes. E por isso os projectos para este tipo de eventos começam, normalmente, a ser elaborados com anos de antecedência. Mas nem sempre assim acontece. No caso do Complexo Olímpico de Deodoro (Rio de Janeiro) e apesar de o concurso publico internacional ter sido realizado no final de 2012, só foi possível iniciar os projectos já no final de 2013. Na Copa do Mundo FIFA de 2014 em que também colaborámos, foi necessário preparar os projectos do estádio de futebol de Fortaleza com alguma rapidez, ainda assim com bastante antecedência. Já no Euro 2004 e apesar de no Estádio do Algarve ter havido tempo para a preparação dos projetos, no caso do Estádio do Sport Lisboa e Benfica tivemos de trabalhar em contra-relógio, uma vez que só começámos os projectos em fevereiro de 2002 e a inauguração da “Catedral” (como é conhecido pelos adeptos do clube) teve lugar em outubro de 2003.
A contrastar com esta realidade, o Focus Group está agora a participar nos concursos de concepção-construção para o Campeonato do Mundo FIFA de 2022, no Qatar. A seis anos de distância, os responsáveis do Comité Supremo do QATAR2022 querem mostrar ao mundo como conseguirão, muito antes do prazo limite, ter concluída a construção de todos os estádios bem como as restantes infraestruturas necessárias.
Como disse, as competições desportivas são calendarizadas com anos de antecedência. Com os atrasos que invariavelmente acontecem (e que normalmente resultam de indecisões políticas), os projectistas, mas também as construtoras e outros fornecedores, têm de fazer um esforço enorme porque os prazos não podem falhar. No entanto, como tenho procurado explicar, a antecipação dos prazos neste tipo de competições nem sempre se apresenta como uma boa solução. Para cada campeonato do mundo de futebol, por exemplo, a FIFA edita um livro com todos os requisitos técnicos que os estádios que serão palco dos jogos terão de respeitar. Contudo, esse manual técnico apenas é actualizado após a realização do mundial de futebol imediatamente anterior, incorporando, nomeadamente, o impacto da evolução tecnológica que certamente ocorre até lá. Ou seja, no caso do Qatar2022, somente após a edição do Campeonato do Mundo na Rússia em 2018 é que saberemos, com rigor, quais os requisitos dos estádios que acolherão a competição no Qatar. A questão é que, de acordo com o calendário definido pelo Comité Supremo do Qatar2022, está previsto que os estádios estejam terminados em 2019, o que implica necessariamente que os projectos terão de estar concluídos bastante tempo antes, sem poderem incorporar eventuais mudanças nos requisitos técnicos.
O legado destes eventos desportivos é também hoje uma preocupação importante que merece uma cuidada reflexão por parte dos países anfitriões. Seja para justificar às populações o porquê dos avultados gastos públicos em infraestruturas desportivas, seja para garantir a exploração e manutenção futura dos complexos desportivos após os eventos. Em Portugal, é incontornável recordar alguns dos estádios erguidos para o Euro2004 e que atualmente não têm qualquer utilização, ou que apenas são usados de forma esporádica e pontual, grande parte das vezes para acolher eventos não desportivos (ex. concertos musicais). No Rio de Janeiro, com a contestação nas ruas aos milhares de milhões de reais gastos com a “Copa do Mundo” e com os Jogos Olímpicos, a discussão sobre o “Legado” foi grande, mas tenho sinceras dúvidas de que o tema tenha ficado bem resolvido. No Qatar, esta questão terá de ser igualmente muito bem ponderada. Desde logo porque no Qatar, apesar da aposta do país em ser o palco de importantes eventos desportivos, o futebol não é um desporto-rei. Ali não há (atualmente) clubes de futebol, nem as elevadas temperaturas que se fazem sentir permitem a prática da modalidade em grande parte do ano. Aliás, não é por acaso que pela primeira vez, no Qatar, o mundial de futebol será disputado no Inverno.
É caso para dizer: agora que terminou um verão pródigo em eventos desportivos, é tempo de analisar (e aprender com) os resultados e focar-nos em preparar os próximos.