“Continua a vigorar muito a cultura do preço em Portugal”
Actualmente com cerca de 140 funcionários, a AGM sente a crescente aposta dos seus clientes na Bélgica e pretende duplicar o volume da sua facturação no mercado português
Pedro Cristino
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Fundada em 2011, em Braga, a AGM é hoje uma empresa com um volume de trabalho assinalável no mercado belga, uma região pouco usual para o sector da construção português. De acordo com Nuno Vieira, director-geral da construtora bracarense, os mercados que recebem os maiores fluxos de concorrência são os que a empresa risca do seu mapa estratégico, o que a levou a abrir representação no Reino Unido e a fazer prospecção de oportunidades no Perú. Actualmente com cerca de 140 funcionários, a AGM sente a crescente aposta dos seus clientes na Bélgica e pretende duplicar o volume da sua facturação no mercado português.
Como iniciou a AGM a sua actividade?
A AGM foi fundada em 2011, pelo Mário Maia, que já tinha tido – e ainda tem – actividade junto das empresas ligadas à construção civil. Quando iniciei a minha actividade na empresa, o trabalho que realizava consistiu em demonstrar, às construtoras belgas, que a nossa oferta integrada dos vários serviços que temos – construir um edifício, até à fase de acabamentos, mas com apenas uma empresa prestadora de serviços – era uma mais-valia para elas porque as ajudaria em toda a gestão da obra até esse ponto. Foi difícil conseguir que a primeira construtora começasse a trabalhar com uma empresa que não conhecia de lado nenhum, de uma forma que, para elas, não era normal. Mas, depois de conseguirmos o primeiro contrato, o volume de obras desse cliente aumentou muito e os outros clientes, tendo a referência do nosso trabalho, começaram também a consultar-nos. Neste momento, já nem fazemos trabalho de prospecção comercial. Os últimos clientes que temos angariado, foram eles que nos contactaram, devido a essas referências.
Porquê o mercado belga?
Em Portugal, em 2011/2012, a crise ainda era muito sentida. As empresas estavam com grande dificuldade em garantir o pagamento dos seus trabalhos, havia insolvência de várias empresas, dificuldades financeiras dos nossos clientes e, assim, sobrava o mercado internacional. No mercado internacional, o país mais próximo era Espanha que vivia uma crise idêntica ou pior que a nossa. França foi o mercado de eleição para todos os nossos concorrentes, ou seja, começava a ficar saturado com empresas portuguesas. Assim, o destino mais próximo que tínhamos era a Bélgica.
Mas a Bélgica é um mercado maduro, com concorrentes de grande dimensão…
As empresas de grande dimensão que existem são belgas e precisam dos serviços das empresas portuguesas porque, sendo um país pequeno, tem pouca mão-de-obra. As empresas portugueas que lá operavam neste âmbito ofereciam um serviço básico, no sentido em que a gestão obra, o planeamento, a direcção de obra e o acompanhamento técnico não estavam incluídos – faziam apenas execução. E nós juntámos à execução, a gestão de obra, com engenheiros civis e técnicos superiores de higiene e segurança, algo que não era usual nas empresas que operavam no país.
Passaram então a ser vistos como uma empresa inovadora nesse mercado?
Exactamente. Temos clientes que passaram a ter equipas próprias de gestão e reduziram as equipas de três, para um elemento, por exemplo. Isto é, delegam a gestão, o planeamento e o acompanhamento à nossa empresa.
Diria que é essa a vantagem competitiva mais importante que conseguiram apresentar no mercado belga?
Essa e a integração dos vários serviços num só.
Que vantagens vos coloca este mercado?
É um mercado estável, ou seja, a flutuação do volume de trabalho não oscila muito de ano para ano. Há estabilidade, há sempre perspectivas de futuro e para os anos seguintes, o que permite sustentar o crescimento da nossa empresa, sem receio que, no ano seguinte, não haja trabalho. É um mercado onde os clientes respeitam os compromissos que assumem. Exigem que cumpramos os nossos, mas cumprem os deles, a nível de pagamentos, datas de pagamento e valores aprovados.
Uma questão importante…
Muito importante e que era uma cultura que já não se vivia cá em Portugal há algum tempo.
Sentem que já são reconhecidos no mercado belga?
Sem dúvida que sentimos isso. O mercado já nos conhece e isso vê-se pelo número dos pedidos de contacto que temos de vários outros clientes, com os quais nunca tínhamos trabalhado, mas que nos conhecem devido às referências. Um contributo muito grande que este mercado nos deu foi habituar-nos, a nós, às nossas equipas e à nossa cultura de empresa, ao rigor do cumprimento dos nossos compromissos, que não era assim tão normal aqui. Em Portugal é culturalmente aceite que, na altura da assinatura do contrato, os clientes se comprometam a pagar em 30 dias, para depois pagarem em 60, e que as empresas se comprometam a executar a obra em 12 meses, para depois executarem em 14. Na Bélgica isto não é aceite e a nossa cultura de empresa moldou-se a este aspecto mais anglo-saxónico e isso tem dado frutos.
De que forma?
Principalmente junto do cliente particular, que é um mercado que sentimos que está em crescimento e que preza muito o aspecto do cumprimento do prazo e do orçamento. Agora, em Portugal, a nossa grande aposta para 2017, que começou a dar os seus frutos em 2016, tem sido as obras com concepção-construção. Segundo o modelo tradicional, o cliente queria construir uma moradia, um edifício ou uma clínica, contrata o arquitecto, escolhe o projecto e vai ao mercado ver qual o preço para a execução da obra o que, frequentemente, traz alguns dissabores. Imaginemos que o cliente teria 500 mil euros para executar a obra e, depois do projecto pronto, o mercado está disponível para lhe fazer a obra por 600 mil. Connosco, o cliente apresenta-nos o projecto, dá-nos o caderno de encargos, diz-nos quanto quer gastar e nós formatamos o projecto para cumprir o prazo e o orçamento do cliente. As premissas são feitas logo a nível do projecto. Se o que o cliente idealizou não encaixa no orçamento, começamos desde início a trabalhar na optimização de custos.
Que desafios encontraram no mercado belga?
Tem-se assistido, cada vez mais, à entrada de empresas portuguesas neste mercado, bem como de empresas polacas, romenas, que têm feito algum “dumping” a nível de preços. O desafio que temos é sempre fazer valer os nossos argumentos e justificar os nossos preços que, neste momento, não são os preços normais praticados no mercado – estão acima. Há clientes que o valorizam, mas há sempre clientes que se sentem cada vez mais tentados a arriscar preços mais baixos. O nosso posicionamento não é o preço baixo, mas sim respeitar o compromisso que assumimos com o cliente desde o início, não baixar o nível de serviço e cumprir com todos os requisitos locais que são necessários para operar no sector num país estrangeiro. Não queremos entrar em guerra de preços e esse tem sido o nosso maior desafio. Outro desafio muito importante refere-se à dificuldade crescente em encontrar mão-de-obra qualificada.
A que se deve isso?
Portugal tem uma população pequena. Por tradição, os operários começaram a aprender a profissão muito cedo e evoluíram com o acumular da experiência ao longo do tempo. Hoje, o ingresso no mercado de trabalho é cada vez mais tardio, a formação que existe nem sempre é a mais adequada, porque a prática nem sempre está incluída e o progresso das pessoas, a nível de evolução pela experiência tarda. Quando atingem a experiência necessária já lhes restam poucos anos de carreira. Para o nosso trabalho, é importante a presença do encarregado – uma pessoa com muitos, muitos anos de experiência que assumia a liderança das equipas. Neste momento, já não há pessoas a entrar no mercado de trabalho para suprir este desafio e nós estamos a substituir essa figura, apostando em técnicos, acompanhados pelas pessoas mais experientes, formando-os dentro da empresas, para complementar a componente teórica que têm com a prática. Agora, o período de formação é longo. Temos de começar a formar um número grande de pessoas e a taxa de aproveitamento deste novo modelo de encarregados que estamos a formar não é de 100%, nem de 50%. Diria que é de 30%. Em cada dez que formamos, aproveitamos três do mais alto nível. Acreditamos neste modelo e vamos continuar a apostar nele. Diria que, na formação académica, é importante haver um reforço significativo a nível de “soft skills” e das capacidades de liderança, para preparar os estudantes para esta necessidade do mercado de trabalho.
Ao mesmo tempo, verifica-se uma quebra no número de estudantes que optam pela licenciatura de Engenharia Civil.
Sim e isso é bastante preocupante. Ao nível do mercado, tem caído bastante o nível de candidatos ao curso. Eu diria que os estudantes estão desiludidos com o que têm assistido na profissão. É vista como uma profissão mal paga, em que a única saída é uma internacionalização forçada, para mercados como o africano. Quem entrou no mercado de trabalho antes de 2008, tinha grandes obras num espaço de tempo muito condensado e a experiência prática era muito acelerada devido à necessidade que as empresas tinham de colocar os projectos no terreno. Neste momento, esse tipo de obra já não existe e a própria aprendizagem é mais lenta, porque o número de oportunidades de trabalho é inferior e o ritmo já não é tão elevado como era.
Têm já uma carteira de clientes considerável na Bélgica?
Temos. O primeiro grande cliente belga que tivemos contratou-nos para uma obra de 700 mil euros. A última obra que este cliente nos adjudicou foi de 3 milhões de euros. O volume por contrato, dentro de cada cliente, tem crescido, o que significa um voto de confiança muito grande. As empresas notam que temos capacidade para assumir contratos cada vez maiores. Nunca iriam entregar um contrato dessa dimensão a uma empresa que não conhecem.
Isso, por sua vez, tem levado também a empresa a crescer?
Temos crescido, mesmo a nível de quadros de gestão e de quadros de acompanhamento de obra.
Relativamente à actividade em Portugal, notam algum sinal de retoma?
Retoma efectiva, neste momento, não podemos dizer que haja. Notamos que há sinais de retoma e estamos a apostar nos sinais que lemos no mercado, mas estamos também a apostar num produto que nos diferencia dos demais concorrentes, que é a concepção-construção ou a optimização de custos mais construção. A construção – apenas a execução dos projectos dos outros – não tem sido um mercado em que nos tenhamos conseguido diferenciar. Continua a vigorar muito a cultura do preço, o que não é o nosso posicionamento. O serviço que oferecemos tem qualidade e sentimos que não podemos competir com empresas que fazem preços baixos apenas para garantir carteira. Queremos construir, queremos crescer, mas queremos cumprir com todas as responsabilidades que temos para com os nossos colaboradores, com os nossos fornecedores, enfim, com todos os nossos parceiros, e uma das responsabilidades é a sustentabilidade do negócio da empresa. A empresa tem que ter uma margem operacional que lhe permita continuar a crescer, cumprir os seus compromissos e garantir a sua sustentabilidade. Por isso, não queremos entrar em guerra de preços e para não entrarmos, apostamos no produto que sentimos que o mercado necessita.
A questão do preço poderá afastar de alguma forma as oportunidades de trabalho que há em Portugal da AGM?
Sem dúvida. Essa é a maior questão que nos afasta desse mercado.
Parece ser uma questão transversal a todo o sector…
É sim. Há 10 anos que não assistimos a um aumento de preço. Tanto no sector público como no privado, porque o sector privado funciona um pouco da mesma forma que o público. O sector público lança um concurso e consulta várias empresas e o privado, antes de decidir executar uma obra, também consulta várias empresas.
Apesar do peso grande que o mercado belga tem na vossa actividade, nunca desistiram do mercado nacional…
Não e a nossa aposta para 2017 é duplicar a facturação a nível nacional. Não é um desafio fácil este a que nos propomos mas estamos motivados e a trabalhar para isso.
Que oportunidades identificaram para motivar essa aposta?
O interior do país, a nível de Trás-os-Montes tem muitas oportunidades. Sentimos que Braga, a cidade que acolhe a nossa sede, vai sofrer um impulso, semelhante ao que sofreu Lisboa e que depois foi canalizado para o Porto.
Refere-se à reabilitação?
Exactamente. O valor imobiliário dos imóveis no Porto começa a atingir níveis altos, e os investidores começam a ver em Braga uma cidade próxima do aeroporto do Porto e com preços ainda acessíveis para reabilitar, o que nos tem levado a sentir que esse mercado em Braga vai começar a dinamizar-se em 2017.
E além de Braga?
O Porto continua com muito dinamismo, e há de continuar em 2017, embora com alguma queda face a 2016. O segundo semestre de 2016 em Braga foi em crescendo mas, para 2017, admitimos alguma explosão. Depois, em Trás-os-Montes, com fundos europeus destinados para desenvolver e criar mais infra-estruturas na região estão a dinamizar essas zonas. Depois há o investimento das grandes superfícies: está anunciada a vinda para o mercado nacional de uma empresa espanhola de distribuição alimentar que é a Mercadona e sentimos que as insígnias Continente, Pingo Doce, Aldi, Intermarché estão a tentar ocupar todos os espaços disponíveis e estão a construir com muita força a nível nacional, para tentar fechar a porta à Mercadona e isto tem ocupado as grandes empresa de constrção em Portugal, as que são maiores que a AGM. Estas empresas estão a dar trabalho a empresas da nossa dimensão que têm mão-de-obra aos preços de há 10 anos. Mas 2017 vai ser um ano em que sentimos que o mercado da construção vai crescer. Para além desta questão das insígnias da distribuição alimentar, temos os municípios do interior do país e temos a questão da reabilitação em todas as cidades em torno do Porto e próximas do aeroporto. Sentimos que não há mão-de-obra em Portugal para fazer face à procura.
Vamos ter que importar mão-de-obra?
Vamos ter que subir os preços de forma a que toda a mão-de-obra afecta aos demais países europeus regresse. Nós, como temos muita mão-de-obra própria,sentimos que temos aqui uma vantagem competitiva para 2017. Mesmo face aos concorrentes que temos, que têm muita mão-de-obra própria, nós temos outra vantagem competitiva, que é o gabinete técnico de arquitectura e engenharia.
Com esse gabinete, conseguem apresentar logo o projecto “chave na mão”?
Exactamente. É essa a nossa aposta para 2017.
Além da Bélgica, apostaram em mais mercados?
Abrimos uma filial no Reino Unido, onde estamos a fazer prospecção comercial. Contamos ter o primeiro projecto em meados de 2017. Por outro lado, regressámos agora de uma missão de reconhecimento na América do Sul, mais concretamente no Perú.
Acabaram por fugir aos mercados mais tradicionais da construção portuguesa, como PALOP e Brasil?
A nível estratégico, os países que maior fluxo recebem de concorrentes são os que riscamos do nosso mapa.
A vossa aposta internacional recairá sobretudo na Europa?
Sobretudo na Europa, sim, mas, para contrabalançar a nossa exposição à Europa, escolhemos o Reino Unido, por ser ainda Europa mas, em contrapartida, também por não estar tão exposto a todos os problemas que podem vir a afectar este continente. Queremos também um mercado fora da Europa que não seja africano nem o Brasil.
A questão do “Brexit” preocupa-vos de alguma forma?
Essa questão foi o catalisador que nos obrigou a abrir a sucursal o mais cedo possível, porque queríamos abrir antes do “Brexit” acontecer, antes de existirem mais barreiras à entrada e estamos a contar ter uma vantagem competitiva face às empresas que queiram ter actividade no país no pós-”Brexit”.
A dinamização do mercado da reabilitação urbana e os projectos que o Estado português se compromete a apoiar ao abrigo do Horizonte 2020 poderão abrir boas perspectivas para o sector?
Sem dúvida. Contamos com esses incentivos para fazer crescer a procura do mercado e para podermos finalmente ter preços que sustentem o nosso negócio.
A questão do esmagamento dos preços parece apresentar-se como o principal entrave ao desenvolvimento do sector da construção em Portugal…
Sim. Tem sido esse realmente o maior entrave.
O Governo considera que poderão já estar no terreno, em 2019, obras para o novo aeroporto de Lisboa. Poderão existir neste projecto oportunidades para a AGM?
As obras públicas de grande envergadura não são tradicionalmente o nosso mercado.
Que balanço faz da actividade da empresa relativamente a 2016?
Foi um ano positivo, o primeiro ano em que não duplicámos a facturação do ano anterior. Decidimos consolidar, reforçar a equipa de gestão, rever procedimentos e estratégias e entendemos que foi um ano positivo – aumentámos o volume, aumentámos a margem face a 2015 e consolidámos procedimentos para começarmos a preparar a actividade para 2017, que prevemos que seja ainda um ano de crescimento.
Acredita que o mercado não crescerá muito mais depois de 2017?
As empresas de construção colocam sempre – ou deveriam colocar – a questão de crescer ou não crescer. Há uma dimensão óptima para cada patamar e sempre que se dá um salto e se cresce, cria-se ineficiência, devido à economia de escala. Em 2015, estivemos perto de atingir aquele que pensávamos ser o nosso ponto alto, o nosso ponto de eficiência máxima e aproveitámos 2016 para optimizar a nossa capacidade instalada e prepararmo-nos para mais um patamar de crescimento, sem perdermos eficiência. Estamos preparados para voltar a crescer, daí eu dizer que 2017 é ainda um ano para crescer. A meio de 2017, vamos avaliar se temos capacidade instalada para continuar a crescer em 2018 ou se temos que nos focar em preparar o crescimento.
Para 2017, que objectivos têm?
Temos o objectivo de duplicar o volume de facturação em Portugal, de incrementar o trabalho no mercado belga e de abrir um novo mercado, ainda com uma facturação reduzida. Por isso, diria que 2017 é um ano em que podemos ter um crescimento de cerca de 20% a 30% face a 2016.
140 funcionários.