“Comunicar que reciclamos 70% dos resíduos é a maior barbaridade”
Há um Mundo a separar o que é anunciado pela Agência Portuguesa para o Ambiente e o que é, de facto a prática. A APA garante que Portugal atingiu já os 71% na valorização dos resíduos da Construção e Demolição quando a meta são os 70% em 2020. Mas o “mercado” garante que a realidade não ultrapassa 1%. A diferença está no que não é declarado e na fraca fiscalização sobre o destino desses materiais. E há uma zona cinzenta na reabilitação paisagista
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A directiva-quadro da União Europeia para a área dos resíduos, apresentada em 2008, prevê que até 2020 se atinja a meta dos 70% da valorização dos resíduos provenientes de trabalhos de construção e demolição. A Agência Portuguesa do Ambiente, enquanto autoridade nacional de resíduos, assegura que neste momento Portugal já ultrapassou o objectivo e atingiu já os 71%. Há, no entanto, quem garanta que os números reais não chegam a ultrapassar 1%. À margem da sessão de apresentação do protocolo da Comissão Europeia, integrado nos objectivos de aposta na economia circular, que decorreu em Lisboa, Luis Realista, director do SmarWaste Portugal, entende que “comunicar que reciclamos 70% dos resíduos é a maior barbaridade”. Ao CONSTRUIR, o responsável pela plataforma que procura potenciar o resíduo como um recurso questiona o que serviu de base a estas conclusões. “Que resíduos foram contabilizados? Os que foram declarados? E os outros?”, pergunta. Para Luis Realista, “importa clarificar a fileira dos resíduos, particularmente a classificação abrangente que os resíduos de Construção e Demolição têm lá dentro”. “Há resíduos perigosos na Construção e Demolição, como é o caso das madeiras velhas com tintas que têm chumbo, colas que fazem parte do envernizamento ou da fixação dos materiais aplicados nas obras, mais concretamente na Reconstrução que devem ser devidamente tratados”, assegura, alertando para a importância de se avaliar o encaminhamento deste tipo de materiais. “O encaminhamento e o destino destes resíduos são coisas que nos preocupam, particularmente quando temos, neste momento, actividades de reclassificação e triagem de resíduos onde se exerce a actividade de deposição de inertes, licenciada, e a actividade de deposição de resíduos em reabilitação paisagista, como pedreiras antigas ou areeiros antigos cujo licenciamento para encerrar contempla o enchimento com materiais que não sejam resíduos”, refere. Luis Realista defende ainda que “a reabilitação paisagística não tem qualquer tipo de acompanhamento. Não são recolhidas amostras, não são feitas prospecções ao que foi depositado e então deposita-se, tapa-se e fecha-se. E o problema surge ‘amanhã’. A cidade de Lisboa tem inúmeros exemplos destes”, assegura.
Grave problema
Ao CONSTRUIR, o presidente da Associação de Empresas de Construção e Obras Publicas e Serviços defende que “há um grande problema no que efectivamente não é declarado”. Os 71% apresentados pela Agência para o Ambiente dizem respeito aos resíduos registados e “há muito que não está declarado”, por isso, são números “enganadores” e “adulteram as estatísticas”. “Até há pouco tempo, empresas que tivessem menos de 10 trabalhadores não eram obrigadas a declarar – o que corresponde a um grosso de “pequenas” intervenções – e por isso havia um grande universo de materiais que pura e simplesmente não fazem parte da estatística”, garante Ricardo Pedrosa Gomes. O presidente da AECOPS acrescenta que, destes 71%, há uma grande margem de eliminação por deposição e não reciclagem de materiais onde se inclui a utilização de produtos de escavação ou inertes para arranjos paisagísticos ou encerramento de pedreiras. “Não que isso seja errado, até porque a Lei o prevê, mas isso não é verdadeiramente fazer o fluxo da economia circular nem a valorização dos recursos porque são, na pratica eliminados e não voltam a entrar no circuito como se pretende”, sublinha. Em 2015, segundo a APA, foram recebidas 16.494 declarações e é apontada uma produção de cerca de 1,5 milhões de toneladas de resíduos de construção e demolição (RCD). Para Ricardo Pedrosa Gomes, “o potencial do protocolo é exactamente servir como um instrumento para a criação de uma cultura e uma atitude, sobretudo nos decisores públicos que têm a responsabilidade de garantir que a legislação que existe é aplicada”. “Trata-se de um conjunto de referenciais sobre formas de actuar na valorização de uma cultura e uma atitude de utilização destes recursos que hoje não existe”, conclui. Com a obrigatoriedade de utilização das Guias Electrónicas de Acompanhamento de Resíduos (eGAR), a partir de Janeiro de 2018, o sector espera que o primeiro problema, do registo das pequenas empresas, fique resolvido, já que a obrigatoriedade é para todos. O presidente da AECOPS salientou a importância do papel das autarquias na fiscalização do cumprimento dos procedimentos correctos pelas empresas de construção, principalmente nas pequenas obras, devido à sua proximidade. Além deste objectivo de valorização dos resíduos de construção, a legislação portuguesa contempla a meta de integrar 5% de materiais reciclados nas obras públicas. O protocolo da Comissão Europeia, integrado nos objectivos de aposta na economia circular, em que se procura reciclar e reutilizar a maior quantidade possível de materiais, tem como objectivo conseguir a valorização de 70% do lixo de construção em 2020, em todos os Estados membros.