Odeon Properties com interesse em residências de estudantes e segunda habitação
Foi a paixão pelo antigo cinema Odeon que deu origem ao nome da empresa de Jorge Capelo e Julien Dufour. Agora, quase cinco anos depois, vão iniciar as obras de um dos mais icónicos edifícios no centro histórico de Lisboa. Manter a “alma” dos edifícios que reabilitam é o principal objectivo, cujo investimento já ronda os 20 milhões de euros
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Em entrevista ao CONSTRUIR, os promotores Jorge Capelo e Julien Dufour, ambos managing partners da Odeon Properties, falam da paixão pela reabilitação e da aposta nas residências de estudantes e co-living, mas também no segmento de segunda habitação, onde existe a oportunidade de criar projectos 100% sustentáveis.
Texto: Cidália Lopes
Como surgiu a empresa e a parceria com o Julien Dufour?
Há cerca de quatro anos, em 2014, eu trabalhava num private office nacional e num dos edifícios que estávamos a desenvolver nessa altura na empresa anterior decidimos vender e um dos compradores era, exactamente, o Julien Dufour. Acabamos por desenvolver uma relação pessoal e passado uns tempos vimos que tínhamos interesses comuns e que a nossa visão era mais ou menos a mesma e para o mesmo tipo de projectos que queríamos desenvolver. E decidimos lançarmo-nos nesta aventura.
Qual foi o projecto que deu início à empresa?
Foi precisamente o Odeon. Numa das nossas conversas vimos que tínhamos ambos interesse num imóvel, do qual gostávamos muito que era precisamente o antigo cinema, que já se encontrava fechado há mais de 20 anos, Como tínhamos mais ou menos a mesma visão reunimos com o proprietário, mas, na altura, o edifício já estava praticamente vendido a um investidores estrangeiros. Não conseguindo comprar o edifício nessa altura, decidimos ficar com o nome e dai nasceu a Odeon Properties.
E o que é que vos chamou mais a atenção naquele edifício?
À primeira vista diria que é a arquitectura com aquela mistura de estilos e com os traços art déco nas varandas, mas quando se entra é que sente uma mística muito própria uma aura, em particular quando se entra pela zona da “boca de cena”. Embora muito degradado é perfeitamente visível onde era o palco, as cortinas, as varandas interiores. E foi precisamente essa magnitude, essa imponência que nos despertou a atenção.
Mas nunca esqueceram o Odeon?
Nunca esquecemos, é verdade…
Mas entretanto avançaram com outros projectos…
Sim, o nosso primeiro empreendimento foi o Ferragial, entre o Chiado e o Cais do Sodré, e que tem duas frentes. Trata-se de um investimento feito, ainda, em plena crise, e por isso optamos por criar ali o conceito de estúdios para responder à procura do mercado. Embora também tenha dois duplex maiores, um com 121 m2 e outro com 127 m2, no topo do edifício. Foi aliás, a partir, destes dois apartamentos, que depois decidimos investir no projecto seguinte, já direccionado para habitação própria.
A vossa estratégia foi desde o início desenvolver projecto na área da reabilitação e direccionados para o alojamento local?
Nessa altura, ainda em tempos de crise, a estratégia foi fazer um produto com o mínimo de risco e que fosse atractivo. Achamos que ao fazer alojamento local estávamos a atingir diferentes tipos de mercado, não só estrangeiros que já apareciam para comprar apartamentos , mas também os portugueses que tinham um Pocket Money de 200 ou 300 mil euros e que tinham algum receio de ter o dinheiro no banco e começaram a investir no imobiliário.
E qual foi o projecto seguinte?
O Flores 45, também no Chiado. Trata-se de um edifício com fachada pombalina, na Rua das Flores que tem um restaurante por baixo, o By The Way. Mas neste caso já é para outro tipo de mercado, com tipologias T2 com cerca de 150 m2. Não só para famílias mas também para quem procure um outro tipo de condições e conforto.
Este projecto, o Flores 45, também foi feito a pensar no arrendamento?
Não tanto. Este projecto tem cerca de um ano de diferença do anterior e o mercado já estava um pouco diferente. Foi pensado mais na óptica do estrangeiro que procurava Lisboa para residir e não para estadias de curta duração.
Quando é que se começou a verificar essa mudança?
A partir do inicio de 2015, em particular, com a aprovação de alguns benefícios fiscais que vieram tornar mais atractivo o mercado português, como é o caso dos 10 anos sem impostos e foi mais nesse sentido que entendemos que este também seria um produto que não acarretaria grande risco para o mercado.
Que projecto têm actualmente em desenvolvimento?
Temos o Arrábida Residence e, que tal como o nome indica, situa-se na rua da Arrábida, também direcionado para famílias, com 10 apartamentos de tipologias T3 e 150 m2. Este empreendimento tem uma particularidade muito interessante que é o facto de ter uma moradia dentro do lote. No fundo, este projecto situa-se onde anteriormente funcionava uma unidade fabril – a fábrica Aveirense – e aquele espaço seriam os balneários que recuperamos para habitação. A fachada tem diferentes alturas e na sua globalidade relembra aqueles edifícios do arquitecto Pardal Monteiro do tempo do Estado Novo e nós quisemos devolver essa importância. Também abdicamos do primeiro andar para dar um duplo pé direito à entrada, para dignificar não só o imóvel mas também os apartamentos. O empreendimento está agora a iniciar a sua construção, embora já esteja vendido na totalidade.
Os vossos projectos remetem normalmente para a história do edifício. Existe essa preocupação?
Sim, esse é um traço comum aos nossos projectos. Como sabe em Lisboa é obrigatório manter as fachadas, mas mesmo quando é preciso demolir e fazer construção nova, nós gostamos sempre de construir de forma a ir buscar a história ou os traços do edifício. No fundo manter a alma do edifício. Por exemplo, no Arrábida, resolvemos, em conjunto com arquitecto, introduzir algumas texturas para dar um aspecto fabril, nomeadamente os tectos em microcimento, as paredes forradas com umas ripas de pinho, as zonas comuns em betão à vista, mantendo alguma das pedras que já existiam e incorporar no projecto novo.
Até à data qual foi o montante investido nos vossos projectos?
Entre aquisições e custos de desenvolvimento dos projectos, já com os gastos calculados para o Odeon, diria que estamos a falar de quase 20 millhões de euros.
Os vossos projectos estão muito ligados a Lisboa e ao centro histórico. Há alguma outra localização que gostassem de investir?
Na minha opinião o imobiliário está muito ligado aos afectos e por isso, quando viajo, apercebo-me de outros locais onde gostaria de desenvolver projectos, em particular, cidades de dimensões mais pequenas que estão também a ganhar projecção e onde vejo que se podem desenvolver alguns nichos de mercado. Mas, a verdade, é que para este tipo de segmento estamos focados apenas em Lisboa.
Falávamos há pouco do Odeon. Retomando, conte-me então como surgiu a oportunidade de investir neste edifício?
O Odeon, tal como muitos outros projectos, não avançou dado a falta de financiamento que se verificou com a crise financeira. E um dia, o Julien recebe um telefonema de um dos proprietários, que tínhamos conhecido alguns meses antes, a dizer-nos que o anterior interessado não tinha conseguido fazer a aquisição e que esta era a nossa oportunidade. No dia seguinte reunimos e vimos que ainda tínhamos condições para avançar com a proposta e a partir daí foi fácil.
Neste momento em que fase está o projecto?
O projecto já foi aprovado e vamos iniciar a construção em breve. Foi feito um trabalho muito intenso em conjunto com a Direcção Geral do Património Cultural (DGPC) e a Câmara Municipal de Lisboa por forma a corresponder o projecto a um conjunto de indicações.
Existiram muitas imposições?
Houve algumas imposições mas nós nunca as vimos dessa forma. Quando começamos a pensar o projecto com o arquitecto, o Samuel Torres Carvalho, o nosso ponto de partida foi “como é que vamos manter aquilo que são as características básicas do imóvel”. E a partir dai começou a nascer o projecto, que irá permitir oferecer à cidade aquilo que gostamos de chamar um “restaurante – teatro” ao mantermos toda a “boca de cena” existente no seu interior e as mezzanines e os balcões lateriais. Qualquer pessoa que visite o Lisboa poderá sentir e reviver aquilo que foi o Odeon no passado.
E relativamente à componente da habitação?
Para a habitação estão contemplados 10 apartamentos.
Para quando o arranque das obras?
Início das obras está previsto para daqui a poucas semanas e a sua conclusão para meados de 2020.
E em termos de investidores o mercado ainda responde favoravelmente a este tipo de produtos, pese embora o aumento dos preços por metro quadrado?
Responde muito bem. Por enquanto os projectos ainda são sustentáveis. Lisboa encontra-se num ponto de confluência em que tudo o que é mau no estrangeiro parece ajudar a cidade. Infelizmente é a realidade. Em função da instabilidade que existe no Médio Oriente temos mais turismo, temos mais pessoas que costumavam comprar em Espanha, França ou no Norte de África, nas antigas colónias, e deixaram de comprar. Temos também muitos turcos e brasileiros a procurarem residência em Lisboa, porque acaba por ser também uma forma de conseguirem entrar e sair da Europa, assim como franceses e escandinavos.
E os portugueses?
O mercado nacional tem crescido, equivale já a cerca de 40% a 50% das aquisições, e tentamos sempre que assim seja. Outra das nossas estratégias é colocar os preços sempre em linha com o que se pratica no mercado nacional.
Ainda em relação ao alojamento local, considera que é necessário regular e legislar?
Considero que o mercado neste momento está numa fase de maior maturidade e que tem a oportunidade de se profissionalizar. Ou seja, se se mantiver o alojamento local como um sector importante para a economia acredito que vários Fundos especializados nestes tipo de produtos gostariam de apostar em Portugal para gerir portfólios na ordem dos 200 ou 300 apartamentos como já é feito no estrangeiro. E este é o desafio que o Governo e as entidades que trabalham neste mercado têm à sua frente.
Concorda com a intenção de criar, em Lisboa, um sistema de cotas para equilibrar aquilo que é habitação e alojamento local?
Não tenho uma opinião muito formada sobre isso. Mas claro que se me disser que vive num prédio com 10 apartamentos e onde só o seu é de habitação e todos os outros serão para turismo é claro que incomoda e que cria um confronto que é necessário regular. Agora regular não é restringir ao ponto do mercado perder interesse e claro que é desafio. É um sector que tem algum risco politico e fiscal. A verdade é que é óptimo para a cidade e para o País. As pessoas focam-se muito na cidade de Lisboa, mas o alojamento local fez crescer o turismo em cidades secundarias e até aldeias que hoje vivem desse turismo.
Além da habitação há algum outro sector que gostassem também de investir?
Ao contrário do alojamento local, um mercado que já está muito maduro, existe um trabalho por desenvolver no que diz respeito às residências para estudantes e ao co-living. Estamos atentos às oportunidades que podem surgir neste sector.
E em que localizações?
Como sabe tanto a Universidade Nova de Lisboa como a Universidade Católica tem apostado na linha de Cascais para desenvolver outros polos de ensino. Mas também Almada que tem um polo universitário muito interessante e a oferta existente é o típico quarto arrendado. Acho que existe ainda um percurso muito grande a desenvolver nesta área, nomeadamente pela própria diversidade que este segmento apresenta. Ou seja, se for um estudante nacional tem um tipo de necessidades que já são diferentes de um estudante Erasmus ou um estudante de Mestrado e os produtos que actualmente existem não fazem esta distinção e por isso é preciso criar produtos adequados às diferentes realidades.
Daqui a 10 anos que tipo de produtos é que gostariam desenvolver?
A nossa intenção, e para a qual já trabalhamos, é criar projectos que sejam 100% eficientes energeticamente. Não têm que ser grandes ou pequenos, mas que deixassem uma pegada completamente neutra. Esse é um objectivo. Nos projectos que já desenvolvemos tentamos sempre ser o mais eficientes possível, mas ainda existem muitas restrições no que diz respeito ao desenvolvimento de projectos no centro histórico de Lisboa. Por exemplo, os telhados têm que estar à vista e por isso não é fácil a colocação de painéis fotovoltaicos. Existe também aquela questão da serventia de vista e o de manter as fachadas. E muito difícil mesmo adaptar um edifício antigo, pombalino a uma categoria A+ ou A+ +mantendo a fachada, mais exigente.
De que forma pretendem alcançar esse objectivo, dado que os vossos projectos são em zonas históricas?
Pensamos que passará pelo desenvolvimento de projectos para segunda habitação fora de Lisboa. Projectos novos, construídos de raíz e que nos possibilitaria que fossem 100% eficientes. Julgamos que é um mercado que está em vias de crescer novamente. Se aparecesse um terreno em Lisboa que nos permitisse desenvolver este tipo de projecto seria o ideal. Mas existem outras zonas com muito potencial como é o caso de Alcácer do Sal, Comporta e todo o Litoral Alentejano onde temos a oportunidade de desenvolver projectos totalmente sustentáveis e manter a natureza como ela está, mas também a zona do Oeste, que historicamente é muito forte neste mercado.