“O WCCE tem de crescer, abranger mais países”
“Através da presença nestas organizações, não só nos apercebemos do que são as visões e as prováveis evoluções da profissão, como também, em termos de mercado e de empregabilidade, temos alguma percepção do que está a mudar”
Pedro Cristino
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Carlos Mineiro Aires, presidente da Região Sul da Ordem dos Engenheiros e, actualmente, também presidente do Conselho Mundial de Engenheiros Civis (WCCE – World Council of Civil Engineers) afirmou, ao Construir, que o maior desafio enfrentado pelos profissionais desta área é a falta de emprego em Portugal. Para Mineiro Aires, é importante para a engenharia portuguesa a sua presença activa em órgãos de organizações internacionais, de forma a que esta ganhe cada vez mais respeito no panorama global.
A juntar ao seu nome, temos também, nos últimos anos, o engenheiro José Vieira na presidência da FEANI e Fernando Branco na presidência da IABSE. Têm sido anos de notabilização da engenharia portuguesa a nível internacional…
Ocupamos mais lugares além desses, mas estes são lugares com uma visibilidade e uma dimensão que merecem alguma reflexão. Temos feito um esforço grande nesse sentido. Temos desenvolvido um grande trabalho na área internacional porque, como qualquer cidadão sabe, o paradigma da engenharia, da empregabilidade e do próprio ensino alterou-se nos últimos anos. Felizmente, a Ordem dos Engenheiros, nestes últimos mandatos, soube entender isso bastante cedo. Então, posicionámo-nos, rapidamente, na área internacional, para tentar fazer acordos com países. Defendemos, como política, que os portugueses devem tentar entrar para os órgãos destas organizações internacionais e que devem participar de forma activa, porque percebemos que há países com estratégias próprias para isto, gostam de dominar conforme as áreas geográficas onde estão. No fundo, estamos a seguir esse caminho e, como somos tão bons, ou melhores até, estamos a tentar seguir uma política destas para também começarmos a conquistar lugares de direcção internacional.
Qual a importância desses lugares?
Muito do que está relacionado com o ensino e a profissão é fortemente influenciado nestas instâncias. Simultaneamente, somos também observadores na União Pan-Americana de Engenheiros, que vem desde o Canadá até ao Chile, onde nos apercebemos como é que estes profissionais lidam uns com os outros, quais os seus posicionamentos em relação aos mercados, etc. Aprende-se muito. Ao estarmos presentes, somos vistos e, nesta organização, somos, com os espanhóis, os únicos observadores. Através da presença nestas organizações, não só nos apercebemos do que são as visões e as prováveis evoluções da profissão, como também, em termos de mercado e de empregabilidade, temos alguma percepção do que está a mudar. Vale mais estar por dentro disto do que de fora. A Ordem dos Engenheiros é muito respeitada nestas questões internacionais, somos chamados com frequência para visitarmos outras organizações congéneres para falarmos de assuntos da mais diversa natureza. Isso tem mostrado aos outros países a capacidade de Portugal. Temos, na parte da engenharia, um bom ensino, muito bons engenheiros e boas empresas. Os nossos engenheiros foram os últimos a ter de sair do país para procurar emprego e, como tal, fomos dos últimos a chegar ao mercado internacional. A verdade é que dá gosto ver que os engenheiros portugueses integram-se, adaptam-se, são respeitados e não têm dificuldade em afirmar-se em qualquer local. Isso deve-se à mentalidade que temos, arranjamos soluções para tudo e sabemos bem entrosarmo-nos com outros povos, interagir com eles e respeitá-los e, para além disso, temos conhecimento e sabemos fazer as coisas. Quando, em simultâneo com isto, temos uma associação profissional, que também tem tido o mérito de saber influenciar para conseguir estes lugares em organizações internacionais, acho que estamos no bom caminho e vamos continuar.
Isto demonstra também que a engenharia lusa está a notabilizar-se cada vez mais no mundo?
A engenharia portuguesa está notabilizada em muita coisa. E não só a civil. Os nossos estudantes são procurados e avidamente levados para qualquer país. Na Ordem, todos os meses há uma incursão de um país da Europa que necessita de engenheiros e vem aqui fazer um recrutamento. Acontece na Ordem, mas também costumam ir às escolas. Por outro lado, também há empresas de referência em Portugal que vêm frequentemente à procura de engenheiros.
Por outro lado, preocupa-o a fuga de profissionais qualificados nesta área em que o país é tão forte?
É óbvio que qualquer pessoa que esteja atenta a isto e que goste do país, tem de se preocupar. Há uma questão social que consiste no facto de ninguém gostar de ver os filhos partir e ninguém gosta de deixar um país envelhecida, sem ninguém para cuidar dos idosos. Essa questão deixa marcas, destrói famílias e não estávamos a habituados a isso. Por outro lado, estamos a formar fornadas de jovens competentes, pagos com os nossos impostos, que depois são entregues a custo zero lá fora. A maior parte deles, se calhar, não volta, e Portugal está a ter uma geração de técnicos envelhecidos que não vão passando o conhecimento às gerações mais novas. Isso é um problema. Em paralelo, também temos assistido, nos últimos anos, a algo que considero ser um desastre, que é a destruição de alguma boa parte da administração pública. Se formos visitar economias fortes, verificamos que as instituições públicas são indispensáveis e são fortes. Aqui, parece que é tudo um despesismo e que é tudo mau. Não pode ser. O conhecimento tem de estar concentrado. Os melhores têm de estar também no Estado e no sector público, pois defendem o Estado. Estamos sempre a falar na reindustrialização, em alavancar a economia, no salto que o país tem de dar e toda a gente já percebeu que o nosso problema são os bens transaccionáveis. Temos de aumentar as exportações fortemente e temos de ser diferentes dos outros, porque exportar mais do mesmo é entrar na concorrência e só podemos concorrer por aí baixando os preços. Temos de diversificar, ser melhores que a concorrência em diversas áreas e inovar. E, para isso, precisamos de engenheiros. Tudo o que é produção tem engenharia. Como é possível desenvolvermos a economia do país sem engenheiros?
Quais as principais missões do WCCE?
O WCCE terá, neste momento, cerca de 30 membros, todos ligados à engenharia civil. Esta associação integra associações mundiais de engenharia e tem-se posicionado de uma forma, quanto a mim, bastante inteligente. Ajudar os países que necessitam e combater a corrupção são as bandeiras do WCCE. Isto porque, grande parte dos países onde temos actividade são do designado terceiro mundo, onde as questões são faladas com frequência e abertamente. Depois, esta associação tem uma ligação forte às Nações Unidas e tem uma forma muito interessante de trabalhar. O presidente que cessou funções trabalha com o presidente eleito, que entra em funções, e com o futuro presidente. No fundo, o WCCE é dirigido num triunvirato o que permite ter uma grande visão para o crescimento. Tem também os comités, permanentes e temporários, que são dirigidos pelos países interessados que os querem integrados e têm como missão ajudar a resolver problemas desses países. Por exemplo, em África, estamos muito focados nas questões da água, desde a partilha dos rios internacionais, à resolução do problema do abastecimento de água. Estamos a fazer trabalhos e monografias em conjunto com as Nações Unidas para ajudar a distribuir investimento e informação. Continuamos a trabalhar para, todos os anos, integrarmos mais três membros e fazemos muita conferência para apoiar o combate à corrupção, evitar os deslizes nas obras públicas e partilhar a nossa experiência. Em breve teremos, entre nós, Angola e Moçambique, Cabo Verde já aderiu e, no meio disto tudo, estamos também a criar uma ponte da lusofonia. Temos uma estratégia que também dá primazia à lusofonia. O WCCE vai tendo uma visibilidade cada vez maior e tem um papel de ajuda aos países e aos Estados.
Quais são os principais desafios que enfrenta o WCCE?
O crescimento. Temos que crescer e abranger mais países, reafirmando os valores que defendemos e ainda reforçar as ligações fortes que temos a organizações internacionais, como as Nações Unidas. Isso é fulcral.
Que dificuldades têm encontrado?
O estado actual da economia também não ajuda, pois posso dizer-lhe que há países que não têm pago as quotas ou que não querem entrar por não terem dinheiro para as pagar. As quotas são calculadas com base numa série de indicadores como PIB e população. Um país mais modesto poderá pagar cerca de 250 ou 300 euros por ano. A economia não tem ajudado a isto.
Na área de engenharia civil, quais os maiores problemas que os profissionais têm de superar?
Em Portugal, o primeiro desafio que enfrentam é a falta de emprego. Na construção civil há, nitidamente, pouco emprego. Na área de projecto e consultoria ainda vai havendo algum. Há muita a gente a trabalhar em gabinete que todos os dias carrega no “Enter” e exporta projectos para todo o mundo. A maior parte dos gabinetes hoje funciona assim, com a subcontratação internacional, em que uns fazem uma parte, outros fazem outra e depois juntam tudo. Os montantes totais da facturação nessa área talvez não atinjam valores assinaláveis, mas ainda vai havendo trabalho. É pena que os países que nos estavam a dar uma grande parte do trabalho nesta área, como Angola, neste momento, têm problemas graves relacionados com a queda do preço do petróleo. É um problema grave.
Como vê o actual estado do ensino da engenharia em Portugal?
Há cinco anos, havia 596 cursos com a designação de “Engenharia” e houve uma proliferação de escolas – politécnicos – pelo país fora. Uma vez que nunca houve uma estratégia integrada para abordar estas questões, isto, depois, condimentado com quatro pitadas da crise económica, via-se logo que isto ia acabar mal. Mesmo sem a crise, iria acabar mal. Há politécnicos com muita dificuldade em arranjar alunos, mas as escolas de referência, que têm qualidade, continuam a tê-los. A engenharia civil foi talvez a que sentiu o maior baque, até por ser aquela área onde é mais evidente que quem tirar o curso terá de sair do país. Depois, há uma desmotivação natural, porque os jovens não gostam de física e de matemática. Agora, nas outras engenharias, não há problemas de empregabilidade. Por este caminho, a formarmos os engenheiros civis que estamos a formar, com estes a partirem para o mercado externo, daqui a uns tempos vamos precisar deles e teremos de importar ou pedir-lhes que voltem.