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    Construção

    Opinião: Vicissitudes da Lei dos Solos

    Um olhar sobre as alterações que determinam a extinção do conceito de solo urbanizável dos instrumentos de gestão territorial

    Construção

    Opinião: Vicissitudes da Lei dos Solos

    Um olhar sobre as alterações que determinam a extinção do conceito de solo urbanizável dos instrumentos de gestão territorial

    Sobre o autor
    Pedro Almeida e Sousa
    Pedro Almeida e Sousa, sócio da TELLES, responsável pelas áreas de imobiliário e urbanismo

    As referidas alterações legislativas decorrem da aprovação da Lei de Bases Gerais da Política
    Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, publicada a 30 de maio de
    2014. O referido diploma veio alterar o paradigma da gestão territorial nacional,
    nomeadamente no que diz respeito à dicotomia Solo Urbano e Solo Rural.

    Até à data da publicação da referida Lei de Bases, considerava-se Solo Urbano também aquele
    que apenas tinha vocação para o processo de urbanização, apesar de não existirem ainda
    quaisquer infraestruturas urbanísticas.

    Com a publicação deste diploma, somente pode integrar a categoria de Solo Urbano aquele
    que está total ou parcialmente urbanizado ou edificado e, como tal, afeto em plano territorial à
    urbanização ou edificação. Os terrenos que não preencherem aquele requisito são
    automaticamente convertidos em Solo Rústico, sem capacidade construtiva imediata.

    A referida Lei de Bases fixou, inicialmente, um prazo de 3 anos para que os Municípios
    procedessem à adaptação dos Planos Diretores Municipais a essa realidade – até julho de
    2017. Chegados a 2017, e porque a adaptação dos planos ainda se encontrava por fazer, o
    legislador acabou por alargar o referido prazo até julho de 2020. Mais recentemente, fruto dos
    efeitos da pandemia o prazo foi novamente alterado, pelo Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de
    maio (legislação da COVID-19), até 9 e janeiro de 2021.

    Este prazo poderá ser ainda novamente alterado na sequência da publicação da Lei n.º
    68/2020, de 5 de novembro, que autoriza o Governo a alterar a Lei n.º 31/2014, de 30 de maio,
    nomeadamente a alargar o prazo previsto no n.º 1 do artigo 78.º da Lei n.º 31/2014, de 30 de
    maio, na sua redação atual, até 13 de julho de 2021.

    Vamos, portanto, para a terceira alteração ao prazo inicial, mais quatro anos do que o
    inicialmente previsto. Aqui chegados, com esta necessidade de se alterar novamente o prazo legal, temos que começar por concluir que todos os intervenientes estiveram pura e simplesmente alheados deste tema, muitos mesmos a olhar para o tema sem acreditar ou medir as suas reais
    consequências.

    Mas, se os particulares, porque menos informados e por se tratar de matéria eminentemente
    técnica, em que claramente é preciso estar familiarizado com o tema, conhecer a fundo vários
    diplomas, não tinham qualquer hipótese de perceber as alterações em curso, as entidades
    públicas, nomeadamente as municipais, deveriam, porque a isso estavam obrigadas, ter
    realizado as intervenções que agora se preparam para fazer, em tempo, de forma organizada e
    politicamente adequada.

    Feita esta nota, será bom dizer que os proprietários de terrenos, classificados como solos
    urbanizáveis, embora dificilmente dentro do prazo que eventualmente restará (cerca de seis
    meses), podem ainda tentar implementar algumas soluções para assegurar, com a intervenção,
    direi mesmo, forte ajuda, das Câmaras municipais, a concretização da edificabilidade dos
    terrenos, através de i) a urbanização programada definida por unidade de execução, ii) plano
    de pormenor, iii) por contrato de urbanização ou de desenvolvimento urbano a celebrar com os
    municípios, iv) por ato administrativo de controlo prévio, ou ainda v) pedido de informação
    prévia com características muito especificas, que permitam balizar muito bem a operação
    futura. Estas soluções são possíveis graças à previsão de um regime transitório que permite a
    subsistência do referido conceito de Solo Urbanizável em determinadas situações. Temos acompanhado vários processos em que esta edificabilidade prevista nos planos está a
    avançar no dia de hoje.

    De olhos postos em julho de 2021
    Dito isto, todos sabemos que dentro do prazo previsto – julho de 2021 – muitas autarquias não
    irão alterar os seus Planos Diretores Municipais, provocando a “caducidade” da capacidade de
    urbanizar esses solos, nada prevendo em alternativa, deixando no limbo todas estas situações,
    incumprindo-se assim as expetativas de muitos milhares de pessoas e deixando à sorte dos
    tempos o destino de muitos quilómetros quadrados do território nacional.

    De facto, a não adaptação dos Planos Diretores Municipais, dentro do referido prazo implica a
    suspensão das normas do plano territorial que deveriam ter sido alteradas, deixando de poder
    haver lugar à prática de quaisquer atos ou operações que impliquem a ocupação, uso e
    transformação do solo.

    Esta situação, que se repete em muitas zonas do território, embora muitas autarquias já
    tenham feito o seu trabalho – são pelo número conhecido, infelizmente menos de 10% dos 278
    Municípios de Portugal Continental que já foram alterados e ajustados.

    Foi assim, sempre com atraso e a reboque, que nos 20 anos que se seguiram ao 25 de abril, por
    pulsão libertadora obrigatária, por falta de experiências e organização dos novos intérpretes,
    talvez por aproveitamento, deixamos destruir metade dos arredores de Lisboa e do Porto,
    metade do Minho e Douro Litoral, nomeadamente tudo o que fosse “junto à estada principal”.

    O que sobrou foi o que estava fora da zona de intervenção de quem queria ter a sua casa, a sua
    empresa, o seu armazém e ninguém lhes dizia como fazer ou punha travão a qualquer
    iniciativa. Apenas assim não foi no Alentejo, por falta de gente e, portanto, de iniciativa
    individual, na Beira Interior e Trás-os -Montes e Alto Doutro por falta de dinheiro, etc..

    Não podemos deixar que se cometam novamente erros por excesso de zelo não programado,
    mas também por falta de tempo e meios para manter o que é de manter, corrigir o que for
    necessário, enfim, cumprir a nossa obrigação de cidadãos, face a um ativo tão importante,
    porque único e tão decisivo para o futuro do país.

    Já que atrasámos quatro anos o que devíamos ter já feito, diria que vamos a tempo de
    reprogramar, de olhar para a lei, para a capacidade de a cumprir, juntar os principais
    intervenientes, moldar os excessos, traçar um compromisso de prazos e objetivos muito mais
    definidos, e depois, cumprir. Mas fazê-lo já.

    É isso que se pede a qualquer Estado e às pessoas civilizadas que têm expetativas entendíveis.

    NOTA: O CONSTRUIR manteve a grafia original do artigo

    Sobre o autorPedro Almeida e Sousa

    Pedro Almeida e Sousa

    Sócio da TELLES, responsável pelas áreas de imobiliário e urbanismo
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