Souto Moura converte convento em lofts de luxo
Espaço de retiro de monjas alentejanas e açorianas, mais tarde deu lugar a um edifício industrial que ao adaptá-lo ao novo uso o descaracterizou. Vitima do terramoto de 1755, o […]

Ana Rita Sevilha
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Espaço de retiro de monjas alentejanas e açorianas, mais tarde deu lugar a um edifício industrial que ao adaptá-lo ao novo uso o descaracterizou. Vitima do terramoto de 1755, o estado actual é o de uma ruína disponível. O Construir foi conhecer o projecto que vai ressuscitar o Convento das Bernardas. O projecto é assinado por Eduardo Souto de Moura
De convento da Ordem de Cister, fundado em 1509, o Convento das Bernardas em Tavira passou em 1834 a edifício industrial, sendo vendido em hasta pública para albergar a Fábrica de Moagem e Massas a Vapor, que acabou por retirar algumas características do edifício original. Contudo, o seu percurso histórico, transformou-se em trágico, e em 1755 na sequência do terramoto, aquele que tinha sido o maior edifício conventual do Algarve sofreu sérios danos e foi votado à ruína e ao abandono. Histórias e memórias vão agora renascer num novo uso, o de um conjunto de lofts de luxo, pelo traço do arquitecto portuense Eduardo Souto de Moura. Citando Souto de Moura num documento que acompanha a memória descritiva do projecto, "o Património não é um caso especial de projecto, precisa apenas de mais 20% de honorários, porque o tosco já lá está. Não precisa de 'cuidados intensivos', precisa apenas de outros cuidados, porque cada caso é um caso, quer dizer uma casa. O Património não é um problema para os partidos, porque todos dizem o mesmo, da esquerda à direita: 'Defender o Património…, defender o Património…'. Também não é uma fonte de despesas, um incómodo, um obstáculo, porque se o for, é porque não é Património. O Convento das Bernardas, foi Mosteiro, Fábrica, e agora ruína disponível. Geralmente associa-se estas pedras a programas como pousadas, hotéis, museus, centros culturais…; mas desta vez fomos diferentes…, e porque não fazermos casas?"
Convento "de luxo"
Em tempos albergou monjas do Alentejo e Açores, agora vai receber 78 lofts de luxo pelas mãos de Eduardo Souto de Moura. O projecto vai ocupar o antigo Convento das Bernardas e o terreno anexo a Sul, que em tempos foi o pomar do convento, e contempla não só a intervenção na pré-existência, mantendo a sua traça, mas também a construção de novos edifícios. Funcionando até meados dos anos 60 como Fábrica de Moagens, a sua adaptação a edifício de cariz industrial, no século XIX, provocou alterações de fundo na estrutura original do convento, nomeadamente ao nível dos vãos, da alteração das cotas dos pavimentos, da demolição de celas e galerias, do claustro e de peças estruturais da cobertura. Pegando em toda a história, memória e condicionantes daquilo que se tornou uma ruína, Souto Moura esquiçou um projecto com 78 habitações de luxo, áreas comuns e arranjos exteriores. Contudo, os lofts respeitam uma espécie de métrica do espaço, uma vez que não se encontram todos implantados no mesmo local, nem todos inseridos na pré-existência. Dentro dos muros existentes do antigo convento vão ficar 54 fogos, sendo que nas alas Nascente, Sul e Poente, "as casas são em banda contínua, com dois pisos e mezanino", pode ler-se na memória descritiva do projecto. Contudo, Souto de Moura alerta, "existem naturalmente excepções à regra", nomeadamente nos topos Noroeste e Sudeste, sendo que segundo o mesmo, para este último prevê-se "a construção de uma habitação toda desenhada para pessoas com capacidade e mobilidade reduzida". Com o objectivo de diluir a imagem no todo do convento, Souto de Moura apostou ainda em criar um novo corpo no prolongamento da ala Nascente. A estrutura existente da Torre será mantida contemplando no seu interior quatro habitações. Para além da estrutura da Torre, também o corpo da igreja será recuperado e dividido programática e espacialmente em três partes. À nave central será dado o uso de recepção/espaço de chegada, e segundo o autor do projecto, "propõe-se a construção de habitações no local do antigo altar a Nascente", bem como na zona a Poente, antigamente ocupada pelas monjas nas cerimónias religiosas. Como reflexo da transformação e história que o edifício contempla, a zona de recepção terá um carácter museológico, onde ficarão expostos objectos que remetem para a memória dos seus diferentes usos, e a chaminé existente será recuperada, por ser "uma memória colectiva de Tavira", pode ler-se no documento da proposta.
Contemporâneo Conventual
Com um historial vasto em termos de intervenções, o facto de voltar a ser alvo de intervenção em pleno século XXI, levou a que o traço da contemporaneidade também fizesse parte dessa história que continua, mas desta feita para uso residencial. Nesse sentido, para além da recuperação do convento e da sua mudança de uso, Souto Moura desenhou novos volumes para integrarem o projecto. Um dos volumes contempla dez fogos, o "Edifício das Salinas", materializa-se em banda e semienterrado e implanta-se na faixa Nascente, entre o edifício do convento e as salinas, "aproveitando o desnível existente de três metros entre as duas plataformas. Outro dos novos volumes denomina-se de "Pátio das Laranjeiras" e contempla 11 fogos a situar no antigo pomar do convento, um conjunto de casas com pátio em dois pisos situados no terreno a Sul. "Casas de Rua" é o nome de mais um novo conjunto de habitações com pátio e adjacentes ao muro que faz o alçado do convento, e aqui ficarão dois fogos. Para além destes volumes, Souto de Moura contempla ainda no seu desenho a criação de uma piscina e um edifício que servirá de balneários.
Interiores "clean"
Dotados de um minimalismo q.b., onde o branco reina nas paredes e tectos, o rústico também dá um "ar da sua graça" ao interior deste novo complexo de luxo, através da utilização de tijoleira rústica nos pavimentos, do soalho de madeira no mezanino e dos azulejos artesanais nas instalações sanitárias. Tratando-se de mais um prenúncio de contemporaneidade, a cozinha, inserida no espaço da sala principal é, como caracteriza Souto de Moura, uma unidade "móvel-cozinha" em madeira esmaltada. Esta unidade, pode ser encerrada na totalidade quando não é necessária, através de portas em sistema de harmónio que segundo o arquitecto, "funcionam suportadas numa calha continua e articuladas entre si por dobradiças invisíveis". As estruturas metálicas revestidas a madeira marcam presença nas escadas de acesso ao mezanino, bem como as molduras de betão que vão reforçar a abertura de novos vãos, que contudo, terão a escala e proporção semelhante aos existentes, quando necessários para o correcto funcionamento das habitações. Ao nível dos arranjos exteriores, os mesmos estão previstos para o pátio principal, através de vegetação e elementos decorativos, nomeadamente a marcação com colunas invocando o antigo e destruído claustro. Aos percursos automóveis juntam-se os pedonais que serão em saibro e em calçada irregular portuguesa. No antigo pomar do convento, onde ficarão algumas das habitações, serão plantadas laranjeiras, e os pátios privados serão dotados de figueiras e amendoeiras. Em jeito de conclusão e voltando a citar o autor do projecto, Eduardo Souto de Moura, "o Património nunca pode ser 'contra-natura', pois só tem sentido sendo reutilizado e assim, ele mantém o seu estatuto próprio de Património".