“Próximos anos em Angola serão de oportunidade”
Augusto Ferreira Guedes considera que, apesar do recente abrandamento do crescimento económico em Angola, há áreas no país que apresentam um desenvolvimento significativo, como a energia, as minas ou as telecomunicações. Para o bastonário da Ordem dos Engenheiros Técnicos, deve não só facilitar-se a circulação dos profissionais de engenharia dos países da CPLP, como criar-se um mercado livre de engenharia, no contexto lusófono
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Augusto Ferreira Guedes considera que, apesar do recente abrandamento do crescimento económico em Angola, há áreas no país que apresentam um desenvolvimento significativo, como a energia, as minas ou as telecomunicações. Para o bastonário da Ordem dos Engenheiros Técnicos, deve não só facilitar-se a circulação dos profissionais de engenharia dos países da CPLP, como criar-se um mercado livre de engenharia, no contexto lusófono
Em entrevista ao CONSTRUIR, Augusto Ferreira Guedes explica como poderá ser reforçada a cooperação entre Portugal e Angola no campo da engenharia e refere que sectores económicos apresentam actualmente melhores perspectivas neste país africano.
Em que assenta o protocolo assinado entre a Ordem dos Engenheiros Técnicos de Portugal e a Ordem dos Engenheiros e a Ordem dos Engenheiros Técnicos de Angola?
Em Angola existe uma associação, que é a APET [Associação Profissional dos Engenheiros Técnicos de Angola] que representa os engenheiros técnicos, e existe a Ordem dos Engenheiros de Angola. O que nós temos estado a fazer é a ponte entre todos os profissionais de engenharia no país, que têm origens diferentes e, portanto, nem sempre as coisas são fáceis porque Angola, fruto de todo o processo destes 40 anos de independência, tem os engenheiros e os engenheiros técnicos que foram formados antes da independência, os que foram formados na panóplia de países de Leste e Cuba e tem os que foram formados na Europa. Portanto, é uma situação muito complexa. É evidente que Angola dá, neste momento, passos significativos para a regulação da actividade. Hoje, felizmente, Angola é cada vez menos uma selva nessa área. O Governo de Angola tem uma estratégia muito importante do rigor porque está consciente de que o desenvolvimento do país tem de ser feito com bases de seriedade na construção, o que não acontece em África. Acontecerá eventualmente na África do Sul e em Moçambique há também uma cultura de rigor, mas a restante África não segue grandes padrões de qualidade. Angola é um país, embora, por vezes, não pareça, tem uma cultura de grande rigor e de grande qualidade, aproximando-se muito a padrões europeus nessa área. Nós fomos solicitados para fazer esta ponte. Ajudámos a criação da APET e, nos últimos tempos, com as novas eleições na Ordem dos Engenheiros de Angola, surgiu também o desafio de nós contribuirmos para a articulação entre as associações. O nosso protocolo, que foi assinado durante o nosso congresso tem a haver com o reconhecimento de uma organização pela outra com um objectivo final, que é criar, no mundo da lusofonia, um verdadeiro mercado livre de engenheiros e engenheiros técnicos. Independentemente dos problemas que existem ao nível da CPLP, de não haver uma livre circulação de cidadãos, gostaríamos que a sociedade civil, ao nível da engenharia, se organizasse para, pelo menos ao nível do exercício da profissão, ser verdadeiramente livre a circulação. Ao nível do exercício da profissão, não faz nenhum sentido que nós tenhamos barreiras. Mas há uma barreira psicológica muito importante que é a que os portugueses colocam aos profissionais de engenharia dos outros países da CPLP. Nós achamos que a engenharia e a formação que se faz nos países da CPLP é de inferior qualidade e, portanto, queremos ter nós a livre circulação nesses países mas, depois, quando os engenheiros desses países vêm cá, já não queremos. Para nós, isso não é possível. Para querermos uma livre circulação nos países de língua oficial portuguesa, temos obviamente de estar disponíveis para dar o mesmo reconhecimento independentemente da escola, da universidade, das melhores ou piores condições, porque também temos escolas melhores e piores em Portugal. Este espírito de império que Portugal e nós, muitas vezes, temos, atrapalha neste juízo. O que temos estado a fazer, embora lentamente, porque isto não pode ser forçado, é criar uma cultura de respeito por cada um dos cidadãos de cada um dos países. Estamos muito satisfeitos, como prova a Associação de Higiene e Segurança que construímos no último Congresso da Ordem dos Engenheiros Técnicos, em Lisboa, onde assinámos o protocolo de constituição da Engenharia da Segurança e da Saúde. São caminhos que se vão fazendo e julgo que começa a haver condições para que isso, a curto prazo, esteja a funcionar. Mas, muitas pessoas, como os colegas de Angola, Guiné, Cabo Verde e Moçambique, gostariam que todo este processo fosse rápido. É mais lento do que gostaríamos mas isto tem o seu tempo e não vale a pena queimar etapas porque pode correr mal e ninguém ganha. Tem de ser feito passo a passo e sem posições de neo-colonialismo.
Portanto, o objectivo final deste protocolo é…
…a criação de um mercado livre de engenharia. Quer dizer, se a arquitectura se quiser juntar a este processo, se não tiver as posições sectárias que tem aqui, também estamos disponíveis para o abrir à arquitectura.
Mas isso também será uma questão a envolver a homóloga angolana da Ordem dos Arquitectos…
Claro! É necessário que se entenda que a arquitectura e a engenharia têm de andar de mãos dadas e que não vale a pena andar aqui nestas guerras de alecrim e manjerona, porque não ganha ninguém – perdemos todos. Mas isso tem a haver com as pessoas, com quem lidera a cada momento cada uma das organizações, também se relaciona com o conhecimento histórico de como a regulação da actividade profissional evoluiu em Portugal e na Europa e, portanto, tudo isso tem de ser compatibilizado.
Como está a situação do reconhecimento de qualificações no campo dos engenheiros técnicos, em Angola?
Angola segue muito a nossa legislação. Nós temos um instituto regulador da profissão, que é o IMPIC, e em Angola foi criado também um instituto regulador, e há alguma legislação que tem vindo a ser adaptada. Nós, até à Lei 40 tínhamos uma série de limitações que hoje não existem e, em Angola, isso reflecte-se também, porque, hoje, ser engenheiro ou ser engenheiro técnico é uma opção pessoal, porque podemos inscrever-nos numa ordem ou noutra. As competências são as mesmas. De um lado, uma pessoa pode demorar mais dois anos a obter um determinado patamar, mas não há nenhum limite.
Há muitos engenheiros técnicos portugueses a trabalhar em Angola?
Sim. O mercado angolano, neste momento, apesar de não ser o mercado de há três anos atrás – que era de euforia – é um mercado estabilizado. Há um paradigma em Angola, que é o do desenvolvimento, e o desenvolvimento faz-se com a engenharia e, curiosamente, a engenharia de que Angola está neste momento a precisar não é apenas civil, como foi há uns tempos. Muitas das outras engenharias estão em desenvolvimento em Angola e nós temos muitos membros nossos em Angola, uns residentes, estabilizados, outros no vai-e-vem dos projectos. Temos estado a ver a engenharia na óptica de civil e, quando se fala em engenharia, fala-se na construção civil. Hoje, se calhar, não é essa a parte mais importante. Temos as comunicações, a informática e a mecânica em franca expansão. Angola também tem outra particularidade que é a própria agricultura, que aqui está em declínio e lá está em grande expansão. Portanto, o número de engenheiros técnicos em Angola, neste momento, é maior nas outras áreas do que em civil, porque, em civil, há um certo compasso de espera. Por exemplo, na área da energia, o desenvolvimento é enorme e, mesmo em Portugal, acho que esta área e a das telecomunicações terão um grande foco nos próximos anos.
Prevê um aumento da mobilidade de engenheiros portugueses e angolanos entre os dois países?
Eu julgo que poderá haver um ou outro caso de engenheiros angolanos se deslocarem a Portugal. Depende também se estaremos disponíveis em Portugal para ter o seu contributo. Mas, em Angola, mesmo com um crescimento inferior ao dos últimos anos, temos toda a área de geologia e minas com um enorme crescimento, tal como toda a área da agricultura e toda a área de energia. Os projectos de electrificação em Angola são, neste momento, de uma enormidade que não temos aqui percepção. Chegando energia, chega desenvolvimento e tudo isso vai arrastar a actividade. Mas não podemos ter a atitude de chegar a Angola e dizer “vocês precisam disto”, porque não funciona assim. É preciso estudar planos de desenvolvimento, parcerias. Não deve ser uma situação em que os engenheiros e os engenheiros técnicos vão para Angola trabalhar, mas sim de os gabinetes de engenharia fazerem parcerias com os nossos colegas angolanos, dando músculo e criando verdadeiros pólos de desenvolvimento, a partir de empresas, parcerias, gabinetes de engenharia, de fiscalização, etc. Considero que os próximos anos em Angola vão ser anos de grandes oportunidades, mas não pode haver a perspectiva de que vamos lá ganhar dinheiro. Devemos contribuir para o desenvolvimento, fazendo parcerias com os nossos colegas, capacitando e criando sinergias. Depois, se não for possível, devido às nossas obrigações para com a União Europeia, termos uma completa circulação livre de todos os cidadãos, diria que, pelo menos, ao nível dos profissionais de um conjunto de profissionais, devia haver um passaporte profissional, como há o diplomático, que permitisse que não perdêssemos tempo a ter o visto. No âmbito da CPLP, devia ser criada uma plataforma para o desenvolvimento da engenharia e profissões afins – como médicos ou enfermeiros – que permitisse uma fácil transferência de conhecimento e isso faz-se através da facilidade de circulação. Os países estão disponíveis para isso, mas não podemos ter a visão de que vamos para lá ensinar. Também vamos para lá aprender e, portanto, podíamos aumentar o nível de desenvolvimento e de permuta de conhecimento, bem como de rendimentos. Há uma coisa que é indiscutível: o relacionamento pessoal entre os povos é determinante para o sucesso das organizações. Temos de dar passos significativos e não é tentar enganar os países da CPLP.
Passos significativos em que aspecto?
Por exemplo, o reconhecimento da importância dos profissionais desses países que possam colaborar aqui, connosco, a importância de disponibilizarmos informação que temos para esses países, sem haver uma moeda de troca. Nós temos material e informação. Disponibilizemo-la. Há muitas coisas que se perderão nos próximos anos se não as disponibilizarmos. Disponibilizemo-las já, a título gratuito, sendo certo que o retorno será feito depois. Era preciso algumas medidas simbólicas deste género para também incutir confiança. Se não houver confiança entre as sociedades não vale a pena. Por exemplo, a COBA, neste momento, é detida pelo capital angolano. Isso é uma parceria. Temos que assumir isso como orgulho e não dizer coisas como “que aborrecido, os angolanos agora mandam na COBA”, ou “que pena a Isabel dos Santos ter comprado a EFACEC”. Quando digo que devíamos ter empresas e projectos em Angola, devíamos orgulhar-nos de também os angolanos terem investidos em sectores em Portugal.
As dificuldades económicas atravessadas por Angola devido à queda do preço do petróleo acabaram por ter um efeito positivo ao obrigarem o país a diversificar a sua economia?
Eu digo, relativamente a Angola, aquilo que disse relativamente a Portugal e à “troika”: felizmente tivemos a “troika” e, se calhar, felizmente, houve a crise do petróleo, que obrigou os angolanos a acordarem. Penso que, neste momento, já começaram esse reajuste e, portanto, acho que, com tudo o que teve de mal a crise do petróleo, teve a enorme vantagem de obrigar a repensar o país e vê-lo de uma forma muito mais consistente para o futuro. Não uma coisa pontual, que vivia do petróleo, mas pensar o país em termos de auto-suficiência numa série de áreas e, seguramente, o país