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    Opinião

    O que nos espera e em que podemos contribuir

    A situação das poucas empresas portuguesas que subsistem é delicada e as perspetivas de futuro não são muito animadoras. Resta-nos a experiência de muitos anos a sobreviver em conjunturas agrestes e essa capacidade resiliente de enfrentar as dificuldades tempera-nos a alma

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    A situação das poucas empresas portuguesas que subsistem é delicada e as perspetivas de futuro não são muito animadoras. Resta-nos a experiência de muitos anos a sobreviver em conjunturas agrestes e essa capacidade resiliente de enfrentar as dificuldades tempera-nos a alma

    Jorge Meneses
    Sobre o autor
    Jorge Meneses

    Foi-nos proposto pelo “Construir” refletir sobre os desafios que a Construção / Engenharia têm neste momento pela frente, o que faremos com todo o gosto e interesse, pese embora  o quadro de alguma incerteza que impende sobre estes setores face à situação internacional.

    A conjuntura internacional que nos afeta sobremaneira, está a passar por uma situação de incerteza como raramente se viveu nos últimos 30 ou 40 anos. Só para ilustrar, o FMI reviu em baixa o crescimento mundial, num enquadramento pós pandémico com ajustamento de mais de três por cento, o que é muitíssimo e só havia ocorrido uma vez nos últimos vinte anos. A Espanha, nosso principal interlocutor comercial passou de um crescimento previsional para 2022 de 7,4% para pouco mais que 4%.

    Apesar das dúvidas, uma coisa parece certa: vamos ter um crescimento muito inferior ao que se imaginava há poucas semanas. Pelo lado inflacionista, já se percebeu que a inflação veio para ficar e está rapidamente a instalar-se com valores significativos, sendo a primeira das consequências a subida das taxas de juro, que já passaram a positivas depois de um longo período abaixo de zero.

    Esta ultima realidade, fornece pistas importantes para se perceber o que pode acontecer no setor da construção, sendo o subsetor dos estudos e projetos de engenharia “o canário na mina”.

    Apesar de tudo temos duas frentes distintas para abordar o mercado: a frente do setor público e a do privado.

    No setor público, o PNI2030 e os fundos do PRR são um importante catalisador da atividade e isso está a verificar-se no presente, particularmente no domínio das infraestruturas ferroviárias, mas também em algum equipamento habitacional, ligado à saúde e ao apoio social, nomeadamente creches e jardins de infância.

    No setor privado, havendo muitas obras em curso, sobretudo no setor hoteleiro e no parque habitacional, as dificuldades crescentes de recurso ao crédito, o fim dos Golden Visa nas principais cidades e a grande subida de preços já instalada em toda a cadeia de valor, com enfase nos materiais e custos dos terrenos, vai acabar por arrefecer a atividade e parece-nos que no domínio dos projetos está a começar a sentir-se algum esfriamento.

    Transversalmente, a escassez de recursos humanos, que se foi paulatinamente instalando, fruto dos baixos salários praticados e da sua desproporção face às responsabilidades crescentes, afastou muitos jovens licenciados das áreas de engenharia de produção.

    Como se sabe, a escassez gera aumento de valor e os principais custos nas empresas de consultoria e projeto são os recursos humanos. Assim, o aumento de custos do principal ativo das empresas, o aumento considerável da energia e do software, associados à pressão inflacionista, conduz a uma situação de difícil controlo dos custos.

    Do lado dos proveitos, o setor dos serviços é dos poucos que tem particular dificuldade em fazer subir os preços, pois as empresas sofrem a concorrência desleal de muitas entidades informais que aproveitam a falta de regulação do mercado, fazendo concorrência às entidades estruturadas que ainda vão estando presentes no mercado. A atomização dos operadores é por isso um fator indireto de preços desregulados e sem critério. Associado a este aspeto, há uma fraca organização e planeamento de muitos clientes, por variadas razões desde a dificuldade na gestão do teletrabalho, até ao enorme peso burocrático instalado, que obriga a que os serviços de projeto se arrastem longos meses com enorme perda de eficiência, obrigando a alocação de meios suplementares, sem qualquer retorno financeiro

    A teia de obrigações e escolhos à atividade das empresas, vem pois de muitas direções e a lista de dificuldades é grande, começando na formação do contrato, em que os documentos a entregar são cada vez mais, o perfil da empresa conta pouco e quase tudo se baseia nos técnicos; o fator preço continua a ser o rei dos critérios de seleção, pois as enormes memórias técnicas, necessárias para obter boa pontuação técnica, quase que se anulam entre os concorrentes, pelo que, após ponderação desproporcionada com o preço, este acaba quase sempre a condicionar em absoluto a decisão final.

    Os cadernos de encargos, são muitas vezes mal definidos e pendem sistematicamente para que tudo o omisso é para fazer, gratuitamente, pelo prestador do serviço. O pagamento raramente está ajustado ao andamento dos trabalhos, havendo situações em que o serviço está feito a 80% e a faturação está num terço. Libertar garantias bancárias ou retenções nas faturas é um mundo de trabalho árduo com horas perdidas a insistir no que deveria ser resolvido automaticamente.

    Enfim, entre a conjuntura global da atividade e a sua especificidade, a situação das poucas empresas portuguesas que subsistem é delicada e as perspetivas de futuro não são muito animadoras. Resta-nos a experiência de muitos anos a sobreviver em conjunturas agrestes e essa capacidade resiliente de enfrentar as dificuldades tempera-nos a alma.

    NOTA: O autor escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico

    Sobre o autorJorge Meneses

    Jorge Meneses

    Presidente da Direcção da Associação Portuguesa dos Projectistas e Consultores (APPC)
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