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    Opinião

    Pensar a arquitetura, criar comunidade

    “O evento, paralelo à Bienal de Veneza, tinha como tema “The New Together”, e entre as duas centenas de projetos escolhidos estava o nosso complexo de uso misto na Rua de António Granjo, no Porto. O fio condutor a unir os vários projetos selecionados era a capacidade que teriam de promoverem novas formas de viver e trabalhar em conjunto”

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    Pensar a arquitetura, criar comunidade

    “O evento, paralelo à Bienal de Veneza, tinha como tema “The New Together”, e entre as duas centenas de projetos escolhidos estava o nosso complexo de uso misto na Rua de António Granjo, no Porto. O fio condutor a unir os vários projetos selecionados era a capacidade que teriam de promoverem novas formas de viver e trabalhar em conjunto”

    Sobre o autor
    Pedro Silva Lopes

    Há dois meses, por volta da inauguração da Bienal de Veneza, recebemos o convite da revista italiana Platform Network, para apresentar um dos nossos projetos no âmbito de um side event da Bienal.

    Para além de ter sido de um prazer imenso partilhar o palco com uma centena de ateliers internacionais, numa belíssima Scuola quatrocentista mesmo no coração de Veneza, o desafio que nos lançaram marcou-me verdadeiramente e terá (já está a ter) certamente impacto no nosso trabalho.

    O evento tinha como tema “The New Together”, e entre as duas centenas de projetos escolhidos estava o nosso complexo de uso misto na Rua de António Granjo, no Porto. O fio condutor a unir os vários projetos selecionados era a capacidade que teriam de promoverem novas formas de viver e trabalhar em conjunto, no fundo, de gerarem este new together, de criarem comunidade.

    Teria muito a dizer sobre este nosso projeto que, instalado numa antiga fábrica de acabamentos, combina uma residência de estudantes com habitação multifamiliar, mas o que nos pediram não foi que falássemos do projeto e dos seus pormenores técnicos, mas que mergulhássemos no conceito. De que forma é que o desenho deste projeto reflete e promove novas formas de habitar? De que forma obriga à interação entre os habitantes? E com o exterior? De que forma suscita novas relações ou regenera ou bairro em que se insere?

    Na espuma dos dias não são muitas as oportunidades que temos para refletir sobre o que nos levou a determinado resultado, para desconstruir conceitos ou mergulhar na origem das coisas. Este exercício de um pensar póstumo, que pode parecer quase inverso ao da nossa prática, revelou-se altamente desafiante.

    É certo que a dualidade de usos esteve presente desde o início do projeto – foi vontade do cliente – mas optámos por levá-la mais longe e fazer dela o centro do nosso desenho. A nossa intenção não foi apenas cruzar realidades distantes, criar uma interseção entre os diferentes usos e os seus residentes, mas ir mais além, suscitar dinâmicas e criar relações entre os estudantes e as famílias que habitam os edifícios deste complexo, e também entre o complexo como um todo e o bairro em que se insere. O tal criar comunidade.

    A própria zona em que está implantado conduziu-nos neste sentido. O Bonfim é uma área fascinante que tem sido alvo de mudanças significativas nos últimos anos, promovidas quer pelo município, quer pela iniciativa privada, atentos à evolução urbana e ao visível potencial desta parte oriental da cidade. O processo de transformação social, económica e cultural desta área é hoje evidente, com uma população mais jovem e negócios inovadores atraídos pela singularidade do bairro e pela sua proximidade do centro do Porto. Nós não chegámos no início, nem no final, mas justamente a meio deste processo de reabilitação em que o património industrial tão característico da área está a ser transformado em novos usos para criar um Bonfim moderno, cool como lhe chamou o The Guardian, mas que mantem esta sua história. E orgulho-me de poder dizer que o nosso trabalho foi mais uma peça fundamental desta regeneração.

    No final, este exercício trouxe-nos outra abordagem ao nosso projeto, uma forma diferente de compreendê-lo e ao seu impacto. Num momento, estamos no atelier, com um cliente, a fazer projeto, a gerir equipas, a pensar em números e, no momento a seguir, três décadas depois de termos saído da universidade, vemo-nos completamente fora da nossa bolha e abraçamos este desafio de pensar a arquitetura. E pensar verdadeiramente, refletir acerca da construção de comunidade, de mundo. Fundámos o Fragmentos há quase 30 anos, em 1994, como um grupo de amigos e, durante algum tempo, fomos exatamente isso, um grupo de amigos, uma família nuclear à qual já se juntaram 50 membros, entre arquitetos, engenheiros e profissionais das mais diversas áreas. É realmente um prazer olhar para estes anos e ver o nosso percurso, mas também perceber que continuamos a aprender, a ser surpreendidos, a sair da nossa zona de conforto, como aconteceu em Veneza, e isso é algo que não tencionamos parar de fazer.

    NOTA: O autor escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico

    Sobre o autorPedro Silva Lopes

    Pedro Silva Lopes

    Arquitecto, atelier Fragmentos
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