BUPi: conhecer o território que temos é valorizá-lo
Paulo Madeira é o coordenador-adjunto da eBUPi, estrutura que tem por missão a expansão do Balcão Único do Prédio (BUPi). Hoje, com cerca de 2,2 milhões de propriedades identificadas (cerca de 26% da meta estipulada) e 154 municípios aderentes ao BUPi existe um caminho a percorrer que será facilitado graças à tecnologia
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Recentemente distinguido com o Special Achievement in GIS Award, prémio internacional, que reconhece práticas de excelência na utilização de Sistemas de Informação Geográfica (SIG), pela ESRI Internacional, o BUPi (Balcão Único do Prédio) é uma plataforma que permite mapear, entender e valorizar o território português, de forma simples e gratuita. O projecto piloto arrancou em 2017 em apenas 10 municípios e desde 2020 que está em fase de expansão no país. A 31 de Dezembro de 2023 o BUPi fechava o ano com mais de dois milhões de propriedades identificadas e este ano prepara-se para acelerar a missão de identificar, localizar e registar propriedades.
Ao CONSTRUIR Paulo Madeira, coordenador-adjunto da eBUPi, Estrutura de Missão para a Expansão do Sistema de Informação Cadastral Simplificado, a quem compete expandir a actividade do BUPi, falou sobre os desafios e o impacto de um trabalho que concorre para uma maior coesão e desenvolvimento territorial.
2023 foi um ano de forte crescimento no número de propriedades identificadas. Que factores motivaram este crescimento?
O BUPi terminou o ano de 2023 com cerca de dois milhões de propriedades identificadas, um aumento de 100% em relação a 2022. Esse crescimento só foi possível com a mobilização dos cidadãos para o projecto e com o empenho dos mais de 960 técnicos habilitados dos 145 municípios que integraram o BUPi até ao final do ano passado, sendo que actualmente são já 154 dos quais 5 na Região Autónoma da Madeira. Foi graças ao seu sentido de propósito, profissionalismo, motivação e à sua excepcional capacidade de trabalho que foi possível cumprir o objectivo de 30% de área de matrizes georreferenciadas e o marco de conhecer 90% da área dos municípios sem cadastro quanto ao tipo de propriedade (pública, privada ou comunitária), ao seu uso e ocupação.
Por outro lado, houve um importante contributo da abordagem inovadora do projecto e da tecnologia, que permitiu implementar incrementalmente melhorias, e naturalmente, dos cidadãos, tanto os enquanto proprietários como no papel de promotores, que aumentaram o conhecimento sobre o projecto nas comunidades.
Em 2024 haverá novo crescimento?
Em 2024, já foram identificadas mais de 220 mil propriedades e este número tenderá a crescer a um ritmo mais acelerado até ao fim do ano, graças a várias inovações tecnológicas que foram, e serão, disponibilizadas, bem como ao reforço das várias acções de comunicação para mobilizar os cidadãos, bem como à aposta dos municípios no projecto.
O impacto tecnológico
Este trabalho começou com um projecto piloto em 2017. Como é que a tecnologia que lhe serve de base, bem como os recursos que lhe são afectos, foram evoluindo e se adaptando (e crescendo) ao longo destes anos?
A base do nosso trabalho passa pela procura incessante de meios para conjugar eficácia e desempenho ágil, por parte da tecnologia e dos técnicos habilitados, com a elevada comodidade para os cidadãos, num processo que se mantenha simples, centrado nas suas necessidades, e que é gratuito e sem qualquer aumento de impostos sobre a propriedade até Dezembro de 2025.
Desde a fase piloto do projecto, entre 2017 e 2018, o BUPi inovou com metodologia de desenho de serviços para construir as soluções centradas nas pessoas e nos utilizadores da plataforma, mas também com o desenvolvimento e disponibilização de uma versão inicial de um algoritmo de dedução de localização das propriedades a partir de informação da Autoridade Tributária carregada na plataforma. Estas ferramentas agilizaram o conhecimento do território e permitiram um resultado de mais de 50% de área conhecida dos dez municípios piloto.
A partir de 2020, data em que se iniciou a fase de expansão do projecto, manteve-se a aposta na tecnologia e na inovação incremental como meios para superar os desafios do conhecimento do território. Essa aposta foi essencial sobretudo para acelerar o projecto considerando que nos anos de 2020 e 2021 o arranque desta nova fase foi marcada pela pandemia da doença COVID-19. Nesse sentido foi desenvolvida uma versão melhorada do algoritmo de dedução de localização das propriedades que já permitiu deduzir a localização mais de seis milhões de prédios, foi disponibilizada uma camada de propriedades sugeridas que usando informação de várias fontes disponíveis no BUPi aceleram a identificação ao evitar em muitos casos o desenho da propriedade pelo proprietário. Em 2022, a eBUPi lançou uma app móvel gratuita e de simples utilização para apoiar os cidadãos que pretendiam identificar e a localizar as suas propriedades directamente no terreno, especialmente em áreas muito arborizadas, utilizando o receptor GPS existente nos telemóveis.
Quantos utilizadores tem actualmente a app móvel?
A app BUPi já conta com cerca de 160 mil downloads e revelou-se, dada a sua simplicidade e eficácia, num instrumento muito utilizado por cidadãos de todas as idades contrariando o preconceito de que as pessoas de mais idade não recorreriam a esta solução.
Entretanto, já em 2024, foi lançado um novo Visualizador do BUPi, que foi desenvolvido numa lógica de co-criação com os técnicos habilitados (desde a fase de levantamento de requisitos ao desenvolvimento e testes). Inclui um cronograma dinâmico (time slider) que permite consultar as várias versões históricas de uma determinada camada de informação geográfica e alternar entre a visualização 2D e 3D, facilitando a utilização das memórias dos cidadãos sobre os limites das propriedades, tal permite por exemplo, verificar como estava o território antes e após certos incêndios, ou antes e após a construção de grandes infraestruturas como estradas, linhas de comboio e barragens o que é muito útil para ajudar na identificação das propriedades.
Ainda durante este ano, surgirão outras novidades, tais como uma nova versão da app BUPi, melhorias ao visualizador do BUPi e outras, que tornarão mais imediato e completo o acesso dos técnicos habilitados e dos cidadãos a todos os dados que dizem respeito às suas propriedades. A forma de comunicar com os cidadãos também conhecerá novidades, com três projectos-piloto: Comunicações Pro-ativas, Consulta pública e “Prédios sem dono conhecido”.
Em linha com as metas do PRR
Relativamente aos números e metas que tinham sido definidas para a Missão, como estamos no cumprimento desses objectivos? O BUPi Já abrange todo o país?
Uma vez que se trata de um projecto cujo financiamento actual resulta de uma candidatura ao Plano de Recuperação e Resiliência, apraz-nos partilhar que as duas metas de desembolso do PRR já se encontram cumpridas e registamos uma taxa de execução de cerca de 20% que está em linha com a média dos projectos financiados.
No que respeita a números operacionais, o balanço é francamente positivo. Estão identificadas, até ao momento, 2 230 999 de 8 627 062 existentes em Portugal Continental, que se encontravam por identificar, isto é, 26%. Sobre a área em hectares, esta é um pouco mais elevada, cerca de 30% do total. O que nos permite perceber que a média de áreas das propriedades é de 0,57 hectares. No caso da Região Autónoma da Madeira, a adesão ao projecto é ainda recente para se poder medir face aos objectivos, mas apresenta números normais para a fase inicial em que se encontra.
Quanto à abrangência nacional, é relevante clarificar qual a área geográfica de actuação do BUPi. A missão da eBUPi é a expansão do processo de alargamento do Sistema de Informação Cadastral Simplificado e do Balcão Único do Prédio (BUPi) aos 172 municípios que não têm Cadastro Predial. Nos restantes, uma vez que existe cadastro predial a componente de georreferenciação não é efectuada pelo BUPi, ainda que sejam aplicáveis os procedimentos simplificados e gratuitos de registo predial. Até ao momento, temos 154 municípios aderentes em Portugal Continental, dos quais cinco pertencem à Região Autónoma da Madeira. Há ainda 14 municípios da Região Autónoma dos Açores que se encontram em fase de adesão.
Que municípios estão mais avançados no processo de conhecimento do seu território?
Essa é uma realidade dinâmica, como se pode observar nos dashboards públicos na área de indicadores do sítio do BUPi na internet, onde é possível consultar a evolução de cada município. Em destaque, em dois gráficos, colocámos um Top 10 dos municípios que mais propriedades, por um lado, e percentagem de área, pelo outro, identificaram. É uma informação que vale a pena consultar regularmente e onde se torna claro que o ritmo de cada município pode variar ao longo do tempo, de acordo com factores tão dispares como campanhas dinamizadas, capacidade de técnicos afectos ao projecto, ou a maior ou menor afluência de cidadãos aos balcões.
Por outro lado, existem também dashboards na área privada de cada município na plataforma BUPi que estão disponíveis para estes e para os Técnicos Habilitados, onde é possível monitorizar o projecto como um todo, bem como a componente do PRR. Estes elementos permitem aos municípios e aos seus técnicos, de forma visualmente clara e apelativa, ter o conhecimento exacto do momento em que se encontram no projecto através de várias métricas, tais como o número de processos por técnico, a média diária, semanal e mensal de propriedades identificadas e quantas faltam georreferenciar.
Quantos proprietários já fizeram o registo das suas propriedades nesta plataforma?
Até à data de realização desta entrevista, contamos mais de 338 mil proprietários que utilizaram o BUPi. As vantagens de que cada um destes cidadãos, hoje, beneficia, são múltiplas, destacando-se que todos os procedimentos e a documentação necessária são gratuitos até final de 2025 e que não existe qualquer aumento de impostos. Por outro lado, o valor inerente ao facto de a propriedade ficar georreferenciada permite que as gerações futuras continuem a conhecer a localização e os limites da propriedade e evita disputas futuras, situação que hoje não é acautelada dado que o conhecimento é passado na maioria dos casos de pais para filhos de forma oral, o que leva a que muitas pessoas saibam que têm as propriedades, mas desconheçam onde elas se localizam. O processo é simples, acessível, sendo que os proprietários podem localizar e indicar os limites das suas propriedades directamente na plataforma BUPi, em bupi.gov.pt, ou, caso pretendam em alternativa um atendimento presencial para esclarecer dúvidas ou pelo simples facto de não disporem de meios informáticos, podem dirigir-se aos balcões físicos BUPi que funcionam nos municípios onde serão apoiados por técnicos especialmente habilitados para esse atendimento. Outro grande benefício para os cidadãos é a protecção dos seus direitos de propriedade para si e para os seus descendentes, dado que o mero registo das propriedades nas Finanças não é suficiente.
Em muitos dos municípios este apoio dos balcões é realizado não apenas na sede do Concelho, mas também através de soluções deslocalizadas com balcões móveis que se deslocam às localidades, balcões nas freguesias, e até mesmo deslocações a casa dos cidadãos, ou seja, não há motivo para que os proprietários não identifiquem e registem as suas propriedades.
O que irá acontecer ao projecto após 2025?
Quanto à Estrutura de Missão a legislação em vigor é muito clara: o limite temporal da sua existência, à data de hoje, é até 31 de Dezembro de 2025. Caberá ao poder político avaliar os resultados atingidos e tomar as decisões de política pública que considere melhores para o BUPi e para o país. De momento, estamos muito focados em entregar os resultados de que o país precisa até final de 2025, acreditando no impacto transformador do trabalho realizado e do movimento nacional gerado pelo BUPi que está a permitir conhecermos o nosso território, identificando e registando as propriedades, e transformar esse conhecimento em valor para Portugal contribuindo para o desenvolvimento económico, social e ambiental com um forte impacto positivo nas gerações futuras.
Os impactos do BUPi sobre a valorização do território
Pergunta inevitável a fazer é: qual o impacto da georreferenciação na adopção de políticas públicas de ordenamento do território?
Paulo Madeira classifica-as do ponto de vista micro e macro. Sobre as primeiras o coordenador adjunto da EBUPi salienta que “o conhecimento do território adquirido através do BUPi já permitiu, do ponto de vista do ordenamento do território e da sua valorização, que os municípios passassem a dispor de informação sobre o território de que não dispunham anteriormente acelerando a sua própria base de conhecimento e permitindo que o processo de decisão em vários domínios passe a ser assente em dados reais, temos ainda exemplos de outras entidades públicas que já estão a utilizar serviços partilhados pelo BUPi para internalizar nas suas actividades e com isso criar valor. São o caso do IFAP que está a utilizar essa informação para permitir desde logo uma melhor gestão e atribuição de apoios aos agricultores, ou do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza) que dispõe de um projecto de 120 milhões de euros para construir faixas de gestão de combustível para prevenção de incêndios rurais e que beneficia da informação disponível no BUPi para acelerar o processo de conhecimento das áreas a intervencionar e nas servidões administrativas a constituir. Em ambos os casos o BUPi permite a estas entidades uma actuação mais focada e eficaz e ainda mais eficiente com uma poupança significativa de recursos financeiros aos contribuintes”.
Já numa perspectiva macro o responsável salienta que o BUPi “permite o conhecimento e actualização de informação da propriedade e dos proprietários o que constitui um valor inestimável para o país poder modelar novas medidas de política pública com base em dados e numa lógica de tomada de decisão data driven.”
Em breve serão apresentados resultados de um estudo sobre os benefícios económicos gerados pelo BUPi para o cidadão, por forma para tornar evidente que as mais valias do projecto não se cingem apenas ao sector público e que são, já hoje, uma realidade para os cidadãos e empresas.